A América Latina passou por uma dúzia de anos de redução da pobreza, no período compreendido entre 2002 e 2014, época em que aproveitou a onda favorável do superciclo das commodities para aumentar o nível de emprego e reduzir a exclusão social. Mas os ventos favoráveis mudaram e a pobreza voltou a subir a partir de 2015.
O “Panorama Social de América Latina, 2017”, da Cepal, mostra que a pobrezaabarcava 45,9% da população latino-americana em 2002, caiu para 28,5% em 2014 e subiu nos 3 anos seguintes, alcançando 30,7% em 2017. A extrema pobreza abarcava 12,4% da população latino-americana em 2002, também subiu nos anos seguintes e chegou a 10,2% em 2017.
Em números absolutos, havia 233 milhões de pessoas na pobreza na América Latina(18 países) em 2002, caiu para 168 milhões em 2014 e subiu para 187 milhões em 2017. Na extrema pobreza havia 63 milhões de pessoas em 2002, caiu para 48 milhões em 2014 e subiu para 62 milhões em 2017. O número de pessoas em situação de extrema pobreza ficou praticamente o mesmo em 2002 e 2017.
Para o cálculo global do nível da pobreza e da extrema pobreza da América Latina(18 países), para os anos mais recentes, a Cepal estimou a pobreza levando em consideração a correlação com a variação do PIB para os países que não tinham dados de 2015 e 2016.
A tabela abaixo mostra os dados disponíveis para os 18 países considerados. Nota-se que o Uruguai é o país com menor nível de pessoas pobres em toda a ALC. Para 2016, havia apenas 9,4 uruguaios em situação de pobreza e um percentual ínfimo de 0,3% uruguaios em situação de pobreza extrema. O Chile que tinha um nível de pobreza superior ao brasileiro, conseguiu melhores resultados para a melhoria da qualidade de vida da sua população e reduziu a pobreza de 22,2% em 2012 para 11,7% em 2015 e reduziu a pobreza extrema de 8,1%, em 2012, para 3,5% em 2015. Os dois países mais secularizados da ALC são os dois com menores níveis de pobreza.
A tabela abaixo não apresenta os dados do Brasil para 2015 e 2016, mas sabemos que nestes dois anos de grande crise econômica houve aumento da pobreza e da pobreza extrema. Mas com os dados disponíveis já se percebe que o Peru conseguiu reduzir mais rapidamente a pobreza extrema do que o Brasil.
A tabela abaixo também mostra que o país que mais aumentou a pobreza entre 2012 e 2014 foi a Venezuela, que tinha 21,2% de pobres em 2012 e passou para 32,6% em 2014. A pobreza extrema passou de 6% em 2012 para 9,5% em 2014 (a crise de refugiados da Venezuela que chegaram à Colômbia e ao Brasil é um exemplo da situação desesperadora do país). Segundo a pesquisa ENCOVI, de 2017, o percentual de pessoas abaixo da linha de pobreza na Venezuela atingiu 81,8% dos lares, enquanto a pobreza extrema chegou a 51,51%.
O relatório da Cepal mostra que os países que mais aumentaram o nível de pobreza em 2015 e 2016 foram o Brasil e a Venezuela, revertendo a redução que ocorreu em outros países da ALC:
“En este caso (2015-2016), la evolución regional de la pobreza y la pobreza extrema está particularmente influenciada por el devenir económico de dos países de significativo tamaño para la región, el Brasil y la República Bolivariana de Venezuela. Dado que no se dispone aún de datos comparables provenientes de las encuestas de hogares referidas a 2016 en el Brasil y a 2015 y 2016 en la República Bolivariana de Venezuela, las proyecciones sobre los cambios esperados en materia de pobreza se ven influidas por la contracción del PIB por habitante del 4,4% (2016) en el Brasil, y del 6,9% (2015) y el 10,8% (2016) en la República Bolivariana de Venezuela. El aumento de la pobreza proyectado en dichos países supera la reducción observada en el resto de la región” (p. 89 e 90)
A tabela mostra ainda que Honduras é o país com maior nível de pobreza da região, seguido de Guatemala, Bolívia, El Salvador, etc. O México – que é o segundo país da ALC em termos de população e economia – também apresenta níveis elevados de pobreza, a despeito de várias políticas de transferência de renda.
Para o caso brasileiro, artigo de Bruno Villas Boas, no Jornal Valor (18/12/2017) mostra os números do aumento da extrema pobreza no Brasil em 2015 e 2016. O número de pessoas vivendo com menos de US$ 1,9 por dia (ou R$ 133,72 por mês) foi de 8 milhões em 2014, passou para 9,8 milhões em 2015 e atingiu 13,3 milhões de pessoas em 2016. Em termos de percentagem da população, a extrema pobreza atingiu o menor nível, de 4,1% em 2014, passando para 4,9% em 2015 e 6,5% em 2016.
O artigo também mostra que havia 52,2 milhões de pessoas em situação de pobreza, representando 25,4% da população total brasileira. O que mostra que o Brasil está atrás da Costa Rica no combate à pobreza.
O fato é que a América Latina e Caribe (ALC) apresentou ganhos fundamentais na redução da pobreza durante o períodos em que o superciclo das commodities favoreceu os termos de intercâmbio e trouxe crescimento da renda e do emprego na região. No processo de reprimarização da economia e com a redução do preço das commodities, em geral, a ALC não conseguiu recuperar o dinamismo anterior e entrou em uma temporada de baixo crescimento e de estagnação social. Resta saber se esta situação será conjuntural e de curto prazo ou estrutural e de longo prazo, pois a alternativa necessária, incluída na meta dos ODS, é o fim da pobreza e da fome para a construção de uma América Latina mais próspera e justa.
“Create a world with no fear
Together we’ll cry happy tears
See the nations turn their swords Into plowshares” Michael Jackson
CEPAL. Panorama Social de América Latina, CEPAL, Santiago de Chile, 2017.
Bruno Villas Boas. Biênio de recessão levou 9 milhões à pobreza, Jornal Valor, SP, 18/12/2017.
Fonte: IHU - Unisinos
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