Se os dois dias anteriores já haviam sido totalmente atípicos na Assembleia Legislativa do Paraná (Alep), ontem o clima extrapolou totalmente a normalidade. Com o prédio cercado por manifestantes do lado de fora dos portões e por policiais do lado de dentro, 33 parlamentares da base governista chegaram ao Legislativo em um veículo da tropa de choque da PM e só conseguiram entrar após funcionários serrarem parte da grade. Ao saber da chegada dos deputados, manifestantes avançaram contra os policiais pela entrada principal da Assembleia, derrubando os portões. Houve um início de confronto, com tiros de balas de borracha, gás lacrimogênio e bombas de efeito moral. Com o recuo dos policiais, os manifestantes cercaram o prédio onde estavam os deputados até o fim da sessão.
• Cerco
Já no início da manhã manifestantes cercaram todas as entradas da Assembleia Legislativa. Servidores da Casa foram impedidos de entrar. A administração da Alep já havia dispensado parte dos funcionários temendo confronto.
• Grade serrada
No início da tarde 33 deputados chegaram à Assembleia em um veículo da tropa de choque da PM. Policiais tiveram que serrar uma grade lateral para permitir a entrada dos parlamentares. O comando do movimento, formado na maioria por professores, pedia o tempo todo manifestação pacífica. Minutos após o início da sessão – mais uma vez realizada improvisadamente no restaurante da Assembleia -, debaixo de uma forte chuva, manifestantes derrubaram novamente os portões e avançaram sobre os policiais.
• Balas e flores
Gás lacrimogênio, balas de borracha e bombas de efeito moral foram lançados e dispersaram momentaneamente a multidão. Alguns ofereceram flores aos policiais, que, aos poucos, recuaram até a entrada do prédio administrativo da Alep. No quinto andar estavam os deputados.
• “Retira ou não sai”
Com a tomada do pátio interno pelos manifestantes, o batalhão de choque se instalou no saguão do prédio administrativo. Fora, os policiais militares mantinham o cordão de isolamento. “Retira ou não sai” era o grito da multidão.
• Desespero
A deputada Cristina Silvestri (PPS), novata na Assembleia, se assustou com os manifestantes. Queria deixar o local durante a sessão, mas foi convencida a não sair. Quando os ânimos se acalmaram, ela e a deputada Cantora Mara Lima (PSDB) seguiram para os gabinetes amparadas por policiais.
• Retirada
Após o recuo do governo e a retirada do projeto, aos poucos, os servidores deixaram o local, lembrando que a ação do governo se assemelha muito com a que o então governador Álvaro Dias teve em 1988. Segundos os professores, o dia 12 de fevereiro, assim como o 30 de agosto, se transformará em um “dia de luta.”
• Socorro
Durante a tarde, alguns manifestantes se sentiram mal. Um deles chegou a desmaiar. Todos foram atendidos por socorristas do Corpo de Bombeiros. O saldo do dia foi de 11 feridos: seis manifestantes, por balas de borracha, e cinco policiais.
• Gentileza
Com o dia se encerrando, professores foram cumprimentar os policiais. “A vida deles é mais difícil do que a nossa”, disse a professora de Francisco Beltrão Neusa Folmann. “Eles nos respeitaram e nos protegeram”, concluiu a colega Valderês Bueno.
• Fica ou sai?
No plenário, um pequeno grupo de professores queria manter a ocupação. No final, todos decidiram sair e acampar em frente ao Palácio Iguaçu, sede do governo. “Tomamos chuva, horas de sol, passamos sede, fome, mas resistimos porque acreditamos na educação”, resumiu a professora Carla Adriana de Araújo, de Paiçandu.
• Black Blocs
Entre os que queriam ficar, a principal reivindicação real era a de ser mais ouvidos nas decisões. “Tudo está muito verticalizado aqui”, criticou Harethon Santos, 26 anos, professor de sociologia no colégio Marli Azevedo, no CIC. “É uma série de movimentos que não têm prática de constituir comando, odeiam sindicatos, partidos. São como os black blocs e o Movimento Passe Livre”, contra-atacou o Professor Cafu, diretor de Relações Sociais da APP.
• Selfies
Quando a situação já estava apaziguada dentro da Assembleia, os professores e estudantes aproveitaram para tirar inúmeras ‘selfies’ nas cadeiras dos deputados. Alguns erguiam os braços, com os punhos cerrados, outros faziam o V da vitória com os dedos. O deputado Tadeu Veneri (PT) foi interrompido quatro vezes durante uma entrevista por manifestantes querendo uma foto com ele.
• Beijinho no ombro
Veneri, em conversa com o Tenente Rocha e o Major Breunig, da Polícia Militar, reclamou da postura de alguns policiais antes da ocupação da Assembleia. Soldados que estavam dentro do plenário foram vistos pelo deputado fazendo o gesto de “beijinho no ombro” para os manifestantes.
• Faturamento alto
Para alguns, a chegada dos milhares de professores significou uma boa oportunidade de negócios. Cleiton Mendes, de 31 anos, vendeu mais de dois mil espetinhos (frango, carne bovina, suína e coração de frango), a dois reais cada. “É a mesma quantidade que vendo em grandes festivais de música”, afirmou. Em dias normais, comercializa cerca de 350 unidades.
• Lei Seca
“Quer tomar sua cervejinha? Pode. Mas fora do acampamento. Senão depois temos que aguentar o pessoal falando que viemos aqui para fazer um piquenique”, dizia uma integrante da APP ao microfone. Depois ela pediu aos ambulantes que vendiam cerveja para saírem de perto. E perguntou: “Precisa fazer plenária para isso?” “Nãoooooo”, foi a resposta.
ANÁLISE
Reação policial foi de alto risco para ambos os lados
A reação dos policiais contra os professores que furaram o primeiro bloqueio na entrada da Assembleia Legislativa na tarde de ontem foi uma ação de alto risco tanto para os agentes quanto para os manifestantes. De um lado, a tropa sob ordens em menor número e, do outro, milhares de professores.
Para o coordenador do Centro de Estudos da Violência e Direitos Humanos da UFPR, Pedro Bodê, porém, é preciso analisar o contexto e não a operação isolada. “A gente sempre olha a ação da PM, mas temos que olhar para quem deu a ordem de reação.”
Bodê não tira a responsabilidade da tropa, mas explica que o caso não é de segurança pública, mas político. De acordo com Bodê, o posicionamento do governador Beto Richa (PSDB) tenta tratar a manifestação como um ato de violência, colocando o episódio na Segurança Pública. “Há uma inversão do que é um ato de violência”, diz.
Operação
A resposta da PM contra os manifestantes, no entanto, poderia ter gerado prejuízos ainda piores. Segundo o ex-secretário Nacional da Segurança Pública, José Vicente da Silva, movimentos desse tamanho sem controle pode gerar pisoteamento, por exemplo.
Apesar disso, ele considerou a ação da PM correta. “Depois de a primeira linha de contenção ser ultrapassada, é preciso fazer uso da força gradual. A polícia precisava manter a ordem”, explicou. O recurso inicial, de acordo com o coronel, é técnica de dispersão com bombas de gás. Segundo ele, o trabalho pode ter reduzido danos. O uso da bala de borracha durante a ação, porém, pode ter sido exagero.
Segundo o coronel, a bala de borracha é usada para neutralizar manifestantes violentos. A reportagem que esteve no local não viu em nenhum momento professores agredirem policiais.
Lado da PM
A PM afirmou que a ação da tropa não foi agressiva e que o número de pessoas feridas é ínfimo diante do tamanho do protesto. A polícia alegou ainda que os soldados só dispararam balas de borracha e usaram sprays de pimenta porque a população avançou contra eles.
fonte: Gazeta do Povo
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