A insegurança jurídica é uma das principais barreiras enfrentadas pelas empresas que querem colocar em prática a nova reforma trabalhista. Quem afirma é Ives Gandra Martins Filho, ministro e ex-presidente do Superior Tribunal do Trabalho (TST). De fato, a lei 13.467, que entrou em vigor em 11 de novembro de 2017, ainda sinaliza mais dúvidas do que aponta soluções. Para Maria Lucia Gadotti, sócia do escritório Stussi-Neves Advogados, trata-se da maior alteração legislativa no direito do trabalho brasileiro desde a Constituição de 1988. "Vivemos um momento de grande insegurança jurídica, pois o TST não se pronunciou corretamente sobre a reforma", afirma. "A pergunta mais comum é se a nova lei deve ser aplicada aos contratos vigentes ou apenas aos novos? Nem isso se sabe ao certo".
O problema da lei, segundo a advogada, está na falta de clareza, o que leva a decisões diversas para um mesmo tipo de processo. Os impactos da nova legislação, porém, já podem ser medidos. "Houve uma redução imediata do número de ações trabalhistas no âmbito nacional na comparação do primeiro trimestre de 2018 com o mesmo período de 2017", diz Maria Lúcia. "O volume de ações caiu de 643.404 para 355.178, o que ainda é muito. Nenhum juiz dá conta de tudo isso com qualidade".
A redução, que apenas na região do TR2, que engloba a capital paulista e cidades contíguas, chegou a 40,42%, está, segundo Maria Lúcia, diretamente ligada à mudança do pagamento do custo das ações. De acordo com a nova lei, o trabalhador que ingressar com uma ação na Justiça do Trabalho contra a empresa e perder, poderá ter de arcar com as custas do processo. Segundo o texto, os chamados honorários de sucumbência serão fixados entre 5% e 15% do valor da ação. "Com isso, temos tido frequentes desistências, total ou parcial, de ações trabalhistas no escritório", diz a advogada.
Na visão de Wanda Helena Godoy, da rede de supermercados Servetodos, empresa familiar com sete lojas em Pirajuí, no interior paulista, e 440 funcionários, a medida tende a mudar o hábito dos trabalhadores de entrarem com ações tendo ou não motivos reais. "O impacto é claro", diz. "Recentemente, tivemos o caso de uma ex-funcionária que pedia um valor alto na justiça. Ao final do processo trabalhista a juíza deu ganho de causa à empresa e ela foi obrigada a nos pagar R$ 800. Isso refletiu diretamente nas lojas, não pelo valor, mas pela decisão." Os benefícios da nova legislação, segundo ela, não param por aí. A permissão da assinatura das rescisões sem a intermediação dos sindicatos foi muito bem-recebida. "Nossas lojas se reportam a três sindicatos diferentes, que não entram em acordo entre si e estão a pelo menos 60 quilômetros da nossa sede", afirma. "Com isso economizamos tempo e dinheiro".
Para Marcelo Silva, do Instituto do Desenvolvimento do Varejo (IDV) e vice-presidente do Conselho do Magazine Luiza, a reforma trabalhista trouxe a possibilidade de negociação direta entre empresas e empregados, sem intermediação de sindicatos. "Isso é bastante positivo, garante agilidade", afirma. "Mas, para que seja positivo, é preciso oferecer ganhos tanto para o empregador quanto para o empregado". O Brasil é o campeão mundial em número de sindicatos, com 18 mil entidades, enquanto o segundo colocado conta apenas com 200.
Entre as mudanças propostas pela reforma que já estão sendo colocadas em prática pelas empresas, Silva cita a jornada intermitente, uma demanda antiga do varejo. No Magazine Luiza 4.000 pessoas já atuaram nessa modalidade e 200 foram contratadas. "Optamos por esse tipo de contratação em datas especiais como Black Friday, Natal e Dia das Mães, com saldo bastante positivo", afirma. "Também temos adotado o trabalho em tempo parcial, o que nos permite aumentar o número de funcionários nos dias e horários de maior movimento de clientes."
Com 12.500 funcionários no Brasil e 10 fábricas, a multinacional Unilever também enfrenta as mesmas dúvidas em relação à nova legislação. "O Brasil está entre as três principais operações da companhia no mundo e fica difícil esclarecer à matriz os meandros da mudança", avalia a diretora de RH Lucyane Rezende. "Por outro lado, a reforma é bastante positiva, porque pode ajudar o país a se tornar mais competitivo." Segundo a executiva, a multinacional tem ampliado práticas de trabalho, como o home office, e flexibilizado os períodos de férias e a jornada de trabalho. "O mercado mudou, a economia mudou, ninguém faz mais nada sozinho. A regra é colaborar e experimentar sem medo", diz. "A reforma nos permite seguir por esse caminho."
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