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PEC 32

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Texto aprovado no Encontro Técnico da FENASTC

  • 16 de agosto de 2023

Matéria original/imagem: FENASTC

A PROPOSTA

O denominado Novo Arcabouço Fiscal, Novo Marco Fiscal ou Regime Fiscal Sustentável foi apresentado pelo Governo Lula, mediante o protocolo do PLP nº 93/2023 na Câmara de Deputados no dia 18/04/2023. Trata-se de exigência da Emenda Constitucional nº 126/2022, art. 6º, que fixou o prazo até 31/8/2023 para referida apresentação. Uma vez sancionada esta lei complementar, deixam de vigorar os dispositivos do Teto de Gastos aprovado por Temer/Meireles mediante a Emenda Constitucional nº 95/2016 (art. 9º).

O autógrafo da apresentação do projeto vem assinado por Simone Nassar Tebet e Gabriel Muricca Galipolo, respectivamente, Ministra do Planejamento e Orçamento e o então Secretário-executivo do Ministério da Fazenda (atual Diretor de Política Monetária do Banco Central).

Fica a pergunta: por que, tendo prazo de oito meses para apresentar um substituto ao malfadado teto de gastos de Temer, o governo Lula antecipou a apresentação do projeto em três meses e meio e sem discussão com a sociedade?

Em que medida essa prática cria consciência social sobre o significado e alcance das políticas macroeconômicas da nação?

Importante destacar que o novo arcabouço permite que cada novo governo defina, no ano inicial de seu mandato, os parâmetros de crescimento de despesa para os quatro anos seguintes. Ele traz mecanismos que permitem o crescimento da despesa, mesmo em momentos de frustração de receita, mas que ainda assim buscam uma limitação de crescimento das despesas públicas de modo a garantir superávit primário e a chamada sustentabilidade da dívida pública federal.

Um bom resumo do texto foi trazido em matéria jornalística, reproduzida abaixo1 com alguns ajustes:

ENTENDA EM 5 PONTOS

REGRA 1. DESPESAS TERÃO CRESCIMENTO LIMITADO

O arcabouço estabelece que as despesas precisam crescer num ritmo menor que a arrecadação. A porcentagem máxima proposta é de 70%. Por exemplo, se arrecadação crescer 1%, as despesas federais só podem crescer 0,7%.

Para fazer a conta de quanto poderá gastar no ano seguinte, o governo usará as receitas primárias líquidas nos 12 meses até junho do ano em curso.

REGRA 2. CRESCIMENTO DAS DESPESAS TERÁ TETO E PISO

O crescimento real das despesas, de acordo com a proposta do governo, não poderá ser menor que 0,6% nem maior que 2,5%.

Por exemplo, se as receitas subirem 4%, ao aplicar a regra 1 o aumento permitido para as despesas seria de 2,8% (70% de 4%), mas a regra 2 barra essa elevação pelo teto de 2,5%. Isso impõe um limite às despesas em tempos de bonança e aumenta a possibilidade de reduzir a dívida pública, já que sobram mais recursos.

Por outro lado, também num exemplo, se as receitas não subirem nada nos 12 meses de referência, a regra 1 deixa de valer e será permitido um crescimento dos gastos de 0,6%. Isso permite que as despesas não sejam estranguladas em anos de crise.

REGRA 3. DESPESAS QUE SÃO EXCEÇÃO

A regra 1, na proposta original, não valia para os gastos com saúde e educação, já que essas despesas têm regras de gasto mínimo estabelecidas pela Constituição. Nessas áreas, as despesas poderão crescer no mesmo ritmo das receitas. Houve alteração na proposta que a Câmara remeteu ao Senado e este também promoveu alterações nas exceções. A versão que saiu do Senado Federal contempla as seguintes exceções:

  1. Complementação do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb),
  2. Fundo Constitucional do Distrito Federal (FCDF),
  3. Despesas nas áreas de ciência, tecnologia e inovação,
  4. Transferências a estados e municípios pela concessão de florestas federais ou venda de imóveis federais,
  5. Precatórios devidos a outros entes federativos usados para abater dívidas,
  6. Transferências constitucionais e legais a estados, Distrito Federal e municípios, como as de tributos,
  7. Créditos extraordinários para despesas urgentes, como calamidade pública,
  8. Despesas não-recorrentes da Justiça Eleitoral com a realização de eleições,
  9. Despesas custeadas por doações, como as do Fundo Amazônia ou aquelas obtidas por universidades, e por recursos obtidos em razão de acordos judiciais ou extrajudiciais relativos a desastres de qualquer tipo,
  10. Despesas pagas com receitas próprias ou convênios obtidos por universidades públicas federais, empresas públicas da União que administram hospitais universitários, instituições federais de educação, ciência e tecnologia, vinculadas ao Ministério da Educação, estabelecimentos militares federais e demais instituições científicas, tecnológicas e de inovação,
  11. Despesas da União com obras e serviços de engenharia custeadas com recursos transferidos por estados e municípios, a exemplo de obras realizadas pelo Batalhão de Engenharia do Exército em rodovias administradas por governos locais,
  12. Pagamento de precatórios com deságio aceito pelo credor,
  13. Parcelamento de precatórios obtidos por estados e municípios relativos a repasses do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef).

As despesas com saúde restaram incluídas no limitador da regra 1. A exceção que havia no projeto original caiu na Câmara e não foi reposta no Senado.

REGRA 4. SE ECONOMIA NÃO FOR SUFICIENTE, APERTO NAS DESPESAS SERÁ MAIOR

Na sua proposta de arcabouço fiscal, o governo estabelece um compromisso de reduzir o déficit fiscal atual, zerando esse déficit em 2024 e obtendo superávit crescente nos anos seguintes.

Esse compromisso propõe uma margem (banda) para cima e para baixo no resultado anual das contas públicas. Por exemplo, para 2025, o governo se compromete a obter um superávit de 0,5% do PIB, variando de 0,25% a 0,75% (as bandas são de 0,25 pontos percentuais para menos e para mais).

Se a economia obtida ficar abaixo da banda inferior, a regra 1 será mais apertada: em vez de as despesas poderem crescer 70% da alta das receitas, só podem aumentar 50%.

REGRA 5. INVESTIMENTOS TERÃO PISO E PODEM CRESCER SE ECONOMIA FOR MAIOR QUE A PREVISTA, MAS COM LIMITADOR A PARTIR DE 2025

A proposta cria um piso de investimentos, de cerca de R$ 79 bilhões em valores de hoje, corrigidos pela inflação de cada ano. Se a economia de recursos públicos ficar acima da banda proposta (entenda o que é essa banda na regra 4), o governo pode usar essa sobra de recursos para fazer mais investimentos em obras.

Isso aconteceria, por exemplo, se o governo obtivesse em 2024 um superávit de 3% do PIB, enquanto seu compromisso para o próximo ano é de zerar o déficit. Como 3% está acima da banda superior, de 0,25%, ele tem licença para investir o excedente.

Mas esse excedente tem um teto de R$ 25bi/ano a partir de 2025, corrigidos pelo IPCA.

A CHANCE DE DAR CERTO

A Nota Técnica nº 08, de 9/5/2023 - Subsídios à apreciação do Novo Marco Fiscal (PLP nº 93/2023 - Regime Fiscal Sustentável), produzida pela Consultoria de Orçamento e Fiscalização Financeira - CONOF e pela Consultoria Legislativa – CONLE, ambas da Câmara de Deputados, nos traz elementos importantes para avaliarmos o Arcabouço Proposto. Utilizando-se de modelo que considera a evolução histórica do agregado de interesse, ajustado, ainda, para capturar alterações recentes que impactarão nos anos vindouros, obteve-se as seguintes anotações. Os grifos são nossos.

“32. Avalia-se que as projeções do governo para as despesas primárias obrigatórias em 2023 e nos anos seguintes são suficientemente críveis. De fato, referidas estimativas do governo praticamente coincidem com o centro do intervalo de projeção das Consultorias. Ressalte-se que nas projeções consideram-se os normativos vigentes, em particular, não há previsão de concessão de reajuste real para o salário mínimo que afeta cerca de 50% das despesas sujeitas ao teto de gastos.2

33. Em relação às receitas primárias, contudo, estima-se que, ausentes modificações no sistema de referência da receita que possam acarretar aumentos na arrecadação federal, a probabilidade de realização de valores na magnitude esperada pelo Poder Executivo, no próximo triênio, é próxima de 35%.

187. A constatação de que existe uma baixa probabilidade estatística de realização da receita prevista no novo marco fiscal, mantida a legislação vigente e as premissas deste estudo, apenas reforça o ponto já mencionado anteriormente nesta nota técnica, no sentido de que o sucesso do novo marco fiscal,

conforme planejado inicialmente, dependerá fundamentalmente de aumento significativo de receitas, não contempladas no cenário base de projeção.

197. Em resumo, a materialização do cenário para evolução da dívida derivado do novo arcabouço fiscal depende da realização de superávits primários e crescimento econômico mais robustos, bem como de juros reais mais comedidos, ao longo do período de projeção, em relação às projeções de mercado e desta nota técnica.”

A CONCLUSÃO QUE SE IMPÕE

Importa destacar, nos termos da própria Nota Técnica nº 8/2023, que o “novo teto adota, de forma geral, a estrutura do anterior”. Apresenta mais sofisticação, inclui regra que fixa um piso variável para despesa, mas estabelece um limite máximo de crescimento nos tempos de bonança fixado 2,5%, quando no período de 1998 e 2022 ela cresceu 4,5% a.a. Mantendo-se para frente a tendência de incremento da receita no mesmo período, que foi similar a esse patamar de 4,5%, haverá garantia de superávits crescentes e brutais restrições a políticas de desenvolvimento. Em especial de se considerar que a partir de 2025 há um teto para incremento dos investimentos públicos fixado em R$ 25 bilhões (corrigidos pelo IPCA). E esse incremento só acontecerá uma vez superada a banda superior da meta de superávit programada. A proposta é pífia, para dizer o mínimo... e incapaz de recolocar o país nos trilhos.3

O novo arcabouço fiscal não foge à lógica da austeridade e dá a ela um ar de sofisticação. Dificilmente o governo conseguirá atender às demandas urgentes da sociedade brasileira ao optar por esse caminho.

Estimativas citadas por Plínio de Arruda Sampaio Jr (em artigo denominado Um Museu de Velhas Novidades) indicam que se o Novo Arcabouço Fiscal estivesse em vigor o desempenho econômico do Governo Lula anterior não teria o mesmo alcance: “Durante a campanha eleitoral, Lula prometeu retomar as políticas sociais de seus dois primeiros mandatos. Não deixa de ser irônico constatar que, se a legislação fiscal proposta agora estivesse então em vigor, suas realizações passadas teriam sido muito mais modestas. Uma simulação mostra que a aplicação das novas regras para o período de 2011 a 2022 teria implicado um corte de R$ 775,3 bilhões nos gastos da União – uma redução de R$ 64 bilhões ao ano, diminuição de 40% na taxa de crescimento real efetivamente observada. Se o mesmo cálculo fosse feito para os anos 2003-2010, período do ciclo de crescimento impulsionado pelo boom de commodities que condicionou o “neodesenvolvimentismo” de Lula, a contração das despesas primárias da União seria ainda muito mais severa e a política de recuperação do poder de compra do salário mínimo, uma das principais bandeiras de seu governo, simplesmente não poderia ter acontecido.”

Por outro lado, para o controle da dívida pública, há o lado da política monetária que não é atacado por esse projeto de lei. Com a autonomia do BACEN a política econômica do governo fica capenga. Dados do Relatório do Relatório de Projeções Fiscais da STN do 1º semestre (p. 64), informam que (considerando abril/2023) uma variação de 1% na taxa SELIC resulta num acréscimo de R$ 40 bi no estoque da dívida bruta do governo geral.

O modelo de economia aberta, adotado a partir dos anos 90, aprofundado com o Plano Real, não tem sido funcional para o desenvolvimento do país. Nos levou a um processo significativo de desindustrialização que resultou na chamada reversão neocolonial. Aprofundou nossa inserção na chamada financeirização da economia. Mostrou suas limitações com a crise de 2015/2016, demonstrando quão frágeis foram os avanços obtidos nos governos petistas até então, com uma rápida ampliação da desigualdade social e dificuldades de tirar o país da crise desde então.

É urgente uma revisão profunda do modelo que recoloque as rédeas do controle da economia sob uma gestão com políticas desenvolvimentistas e sustentáveis, subordinando o capital internacional e financeiro aos interesses nacionais.

*Texto Redigido por Josué Martins, Diretor da Região Sul da FENASTC e destinado a orientar o debate no Encontro Técnico de Brasília.

Diretoria da FENASTC, Julho de 2023.

 

   
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