Artigo de Paulo Liporaci, advogado especialista em Direito Público:
“No dia 1º de outubro, o Ministério da Economia publicou a Portaria n. 21.595, que estabelece a impossibilidade da cobrança da contribuição sindical pelos órgãos e entidades integrantes do Sistema de Pessoal Civil da Administração Federal (SIPEC) nos contracheques dos servidores públicos federais.
A disposição, na realidade, reacende um antigo embate entre as entidades sindicais e o Poder Executivo. Nos últimos anos, foi editada uma série de normativos ilegais e inconstitucionais que têm colocado em xeque a sobrevivência dos sindicatos, uma vez que atacam frontalmente o meio de custeio das suas atividades.
Em razão da relevância da contribuição sindical, a CLT estabelecia, até a Reforma Trabalhista, que o valor era de natureza compulsória e deveria ser pago por todos os participantes de categoria econômica ou profissional ou das profissões liberais em favor do sindicato representativo da categoria (art. 578).
Com a aprovação da Reforma (Lei n. 13.467/2017), a contribuição sindical passou a ser facultativa, de modo que somente poderia ser recolhida mediante autorização prévia e expressa do sindicalizado.
Essa alteração legislativa, por si só, foi capaz de prejudicar essas entidades, uma vez que muitos trabalhadores simplesmente não tinham o ímpeto de realizar esse procedimento de autorização, por não vislumbrarem a importância das atividades dos sindicatos. Dessa maneira, a receita das entidades sofreu um decréscimo significativo.
Apesar de a compulsoriedade da contribuição sindical ter sido extinta, a CLT, em seu art. 582, ainda previa a obrigação para os empregadores de descontar da folha de pagamento de seus empregados que autorizaram, de maneira expressa, o valor referente a um dia de trabalho do mês de março.
Por óbvio, esse procedimento é apenas um facilitador tanto para o sindicalizado, que já permitiu a cobrança, quanto para a entidade sindical, que recebe os valores de maneira regular e consegue arcar com seus compromissos financeiros.
Agora, em nova tentativa de prejudicar as entidades sindicais, foi editada a Portaria n. 21.595/2020, no dia 1º de outubro, que veda a realização dessa cobrança por todas as entidades vinculadas ao SIPEC — ou seja, todas as instituições que exercem atividades relacionadas à administração de pessoal da Presidência da República, seus Ministérios e demais órgãos do governo.
Diversos são os vícios contidos na Portaria. Dentre esses, merece destaque a afronta ao princípio da autonomia sindical, o qual assegura a autogestão dos sindicatos, sem a interferência do Poder Público. Nesse caso, a Administração Pública imiscui-se na esfera organizacional das entidades, ao dificultar arbitrariamente a captação de recursos que viabilizam o desempenho de suas atividades.
Caso seja possível a interferência do Poder Público nos sindicatos, tal como feito por meio da Portaria em comento, a representatividade dos trabalhadores está condicionada ao alinhamento político com o Poder Executivo, o que, por óbvio, não pode ser permitido.
Para além disso, a medida revela-se desproporcional, tendo em vista que o desconto somente ocorria após a autorização expressa do servidor que optou, livremente, por se filiar ao sindicato. Portanto, não há razão para que se exija que o pagamento se dê por outro meio, sendo que a adoção desse procedimento não faz recair qualquer ônus à Administração.
Todos esses elementos demonstram que as medidas que têm sido adotadas com vistas a impedir o desconto em folha dos servidores são inconstitucionais e devem ser levadas ao Poder Judiciário, para que seja reconhecido o ilícito e restabelecida imediatamente a cobrança da forma como disposta em lei.”
FONTE ORIGINAL DO ARTIGO: Jornal de Brasília
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