Não se vê em nenhuma das propostas a busca por maior justiça fiscal
Se perguntarmos ao cidadão brasileiro qual é a reforma tributária de que gostaria, a resposta certamente seria: a que o fizesse “pagar menos impostos”. Se indagarmos ao empresário ou investidor, este acrescentaria o pleito de maior segurança jurídica e simplificação do cumprimento das obrigações fiscais, para reduzir custos indiretos e aumentar a competitividade.
Por sua vez, se colocada a questão a um governante ou parlamentar, de maneira política repudiaria a criação de novos impostos, pregando por maior equidade e menor onerosidade para o seu eleitorado, sem deixar de reclamar por mais recursos para a sua comunidade.
Os interesses são distintos, embora legítimos sob a ótica de cada um deles. A dificuldade é conciliá-los num modelo realista e justo.
As propostas que ora tramitam, tanto na Câmara como no Senado, aludem à unificação de diversos impostos e contribuições em uma única exação, intitulada Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), dotado de não cumulatividade plena, administrado por um comitê gestor nacional e rateado entre a União, estados, Distrito Federal e municípios, prevendo-se um período de transição de cinco a dez anos, assim como a criação de um “imposto seletivo” extrafiscal, além de mudanças pontuais em outros tributos.
Mas, apesar de aspectos positivos, criar um imposto “nacional” como o IBS implica a supressão parcial de competências tributárias estaduais e municipais, substituindo-as por um modelo de repartição de receitas, questionável sob a ótica do pacto federativo. Dotá-lo de uma alíquota uniforme, incidindo igualmente na produção e na circulação de bens, assim como na prestação de serviços, poderá onerar inúmeros setores, repercutindo em toda a economia. E conviver com dois modelos tributários em paralelo durante o período de transição só vai dificultar ainda mais a já dura vida do contribuinte.
Enquanto aguarda-se a apresentação da proposta do governo federal, especula-se acerca da possível criação do Imposto sobre Transações Financeiras (ITF), similar à antiga CPMF, para compensar eventual desoneração da folha, assim como a volta da tributação sobre os dividendos e a instituição de um IVA dual pela fusão de tributos federais.
Infelizmente, não se vê em nenhuma das propostas a busca por maior justiça fiscal, com a implantação de um modelo tributário regressivo, que alcance os contribuintes mais ricos e reduza a tributação sobre os mais pobres.
Tampouco se discute a imperativa mudança da base de incidência tributária, que hoje no Brasil pesa mais sobre o consumo do que sobre a renda e propriedade, o que também prejudica o cidadão menos afortunado.
Qualquer reforma que se pretenda deverá tornar o sistema tributário mais equitativo, simples e transparente, a fim de reduzir o custo fiscal indireto e estimular o pagamento espontâneo dos tributos. Da mesma forma, impõe-se promover a previsibilidade jurídica e uma nova cultura à administração tributária de facilitar a difícil relação entre Fisco e contribuinte, o que contribuirá positivamente ao ambiente de negócios e reduzirá a imensa litigiosidade fiscal que hoje congestiona a Justiça em processos que somam quase R$ 3,5 trilhões.
É utópico, porém, acreditar que uma reforma tributária possa, neste momento, propor a redução da carga fiscal sem antes tornar o gasto público mais eficiente, pois a conta não “fechará”.
Reforma tributária e reforma na despesa pública são lados de uma mesma moeda.
Fonte: O GLOBO
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