Ideia está sendo analisada em conjunto com governadores
A equipe econômica estuda incluir os estados na proposta de reforma da Previdência que será encaminhada ao Congresso. A ideia é permitir que as novas regras sejam válidas assim que o texto for aprovado pelos parlamentares. A inclusão está sendo negociada com os governadores, que receberiam a chancela para mexer em seus sistemas de aposentadorias e pensões sem o ônus político de ter que passar regras nas assembleias legislativas, onde há forte resistência às mudanças.
A proposta original de reforma da Previdência que foi encaminhada pelo governo Michel Temer ao Congresso chegou a prever que as mudanças valeriam para estados e municípios. No entanto, diante da pressão de servidores estaduais e municipais sobre o Congresso, Temer recuou da ideia pouco tempo depois.
Ao longo dos trabalhos na comissão especial que analisou a proposta de emenda constitucional (PEC) de Temer, chegou-se a um meio termo. Ficou acertado que governadores e prefeitos teriam seis meses, após aprovada a reforma, para fazerem ajustes específicos em seus regimes de aposentadorias. Caso contrário, valeriam as regras federais.
A inclusão de estados na reforma é vista pela área econômica como uma maneira de ajudar os governos regionais a tirarem suas contas do vermelho. Em uma das propostas em análise pelos técnicos, as mudanças com maior impacto seriam a convergência para uma idade mínima federal (possivelmente 65 anos) e a obrigatoriedade de que os estados limitem benefícios de novos servidores ao teto do INSS, com a criação de fundos complementares - que hoje é facultativa. Essas mudanças se somariam a medidas já tomadas em alguns governos, como a elevação da alíquota previdenciária de 11% para 14%, adotada no Rio.
Maior engajamento
Segundo técnicos envolvidos nas discussões, há ainda itens que podem ser aproveitados da reforma que já está no Congresso, como mudanças nas aposentadorias especiais (professores e policiais federais, além de trabalhadores expostos a riscos e agentes nocivos). O relatório aprovado na comissão especial prevê idade mínima de 55 anos para policiais federais e de 60 anos para professores. Essas são as duas categorias que mais pesam nas contas estaduais.
Mesmo que não sigam as regras do restante do funcionalismo, é considerado fundamental estabelecer uma idade mínima para esses servidores. Atualmente, professores e policiais se aposentam com idade média de 49 anos, considerada muito baixa por técnicos do governo. Para quem lida com atividades perigosas, não há idade mínima, mas seria exigido tempo de contribuição e comprovação do serviço.
Segundo dados do Tesouro Nacional, em média, os professores compõem cerca de 50% dos inativos do Executivo, enquanto os militares são cerca de 15%. No entanto, em locais como Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Santa Catarina, mais de 80% dos inativos correspondem às carreiras de pensões especiais dos professores e militares.
Na equipe econômica, a leitura é que os novos governadores estão mais engajados na defesa da reforma da Previdência. É o caso, por exemplo, de João Dória (São Paulo) e Eduardo Leite (Rio Grande do Sul), que já expressaram apoio à medida e prometem mobilizar suas bases.
A proposta também já ganhou aderência de nomes da oposição. Ainda durante o governo de transição, em novembro, o governador do Piauí, Wellington Dias (PT), defendeu a reforma da Previdência, após se reunir com o presidente Jair Bolsonaro. Na ocasião, ele afirmou que os governadores do Nordeste devem trabalhar juntos.
Piora das contas públicas
Em 2017, quando o governo decidiu recuar da ideia de incluir servidores na proposta de reforma, o ambiente era diferente. Naquele ano, o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), defendeu a estratégia do Planalto e afirmou que o governo não poderia “assumir a responsabilidade sobre a Previdência dos estados”.
Na avaliação do economista Raul Velloso, especialista em contas públicas, a mudança de tom dos estados reflete a piora das contas públicas nos últimos anos. Segundo dados do Tesouro, o déficit previdenciário dos estados saltou de R$ 74,1 bilhões em 2015 para R$ 94 bilhões em 2017, os últimos dados disponíveis.
O principal problema das contas estaduais, segundo técnicos do governo, é a folha de salário dos servidores, incluindo os gastos com inativos. Instituir uma idade mínima para a aposentadoria dos servidores estaduais é vista como fundamental para equilibrar os gastos.
— O fim do ano passado mostrou déficits orçamentários muito elevados. Isso não era visível antes. E mostrou a dificuldade que os estados estavam tendo para cumprir o dispositivo da Lei de Responsabilidade Fiscal, que proíbe passar restos a pagar sem disponibilidade de caixa no último ano do mandato. A situação se mostrou muito mais grave, e a Previdência é o item de maior peso. O clima é outro, muito mais favorável a reformas — afirma Velloso.
Para o economista André Luiz Marques, pesquisador do Insper, a aprovação da reforma federal, no entanto, não isentará os estados de corrigir desequilíbrios nas contas públicas:
- Eles não podem de forma alguma colocar todas as suas fichas em uma reforma federal. É muito importante, mas eles não podem achar que essa é a bala de prata que vai resolver todos os problemas.
PONTOS DE DESTAQUE DA PROPOSTA
Militares agora ou em uma segunda etapa
- A equipe econômica e as Forças Armadas entraram numa queda de braço sobre quando a reforma dos militares deve ser apresentada. A equipe de Paulo Guedes defende que o governo encaminhe um pacote que inclua tanto as mudanças nas aposentadorias dos civis quanto dos militares, para mostrar que toda a sociedade terá de participar do esforço. Já as Forças Armadas querem entrar após a votação da proposta dos civis em 1º turno, pois, como o trâmite das mudanças dos militares é mais fácil, temem que o endurecimento de regras só ocorra para eles.
Fatiar ou não as mudanças
- Apesar de o governo ter cogitado apresentar o modelo de capitalização em uma segunda etapa, o ministro da Economia, Paulo Guedes, afirmou que a proposta de reforma da Previdência não será fatiada e já contemplará a criação de um regime de capitalização. Por ele, cada trabalhador faria uma poupança individual para financiar sua própria aposentadoria no futuro. O modelo substituiria gradualmente o atual sistema, de repartição, em que os que estão na ativa contribuem para quem está aposentado.
Bônus para as mulheres que são mães
- O governo estuda incluir uma regra em que o número de filhos seja considerado na hora de calcular a idade de aposentadoria. Assim, quem tem dois filhos, por exemplo, poderia se aposentar dois anos antes que o tempo mínimo exigido. O bônus às mães acabaria com a necessidade de diferenciar homens e mulheres na regra da idade mínima. Para especialistas, no entanto, não teria efeito para reduzir a desigualdade de gênero, pois não compensaria as mulheres que não são mães, mas enfrentam dupla jornada. Mulheres recebem salário menor e são mais atingidas pelo desemprego.
Tempo de transição para a idade mínima
- A equipe econômica cogita propor que a transição para a idade mínima de aposentadoria ocorra em 15 anos. A ideia seria uma solução intermediária. Mais curta e dura que a do texto que está no Congresso, que prevê transição em 20 anos, e mais suave que a proposta de fazer a mudança em apenas dez anos, que também é avaliada. A medida geraria economia extra de R$ 120 bilhões em relação ao projeto que está na Câmara. Outra possibilidade em análise é reduzir a idade mínima para 62 anos (homem) e 57 anos (mulher). A proposta de Temer estabelece 65 (homem) e 62 (mulher).
Fonte: O Globo
Comente esta Notícia