Diagnósticos da Câmara e do Senado expõem as dificuldades que o novo governo enfrenta a partir de 2019
O Brasil é, desde 2014, um país que gasta mais do que arrecada. E, segundo avaliação feita por órgãos técnicos ligados à Câmara dos Deputados e ao Senado Federal, a situação não deve mudar durante o governo de Jair Bolsonaro.
Desde 2014, já são cinco anos consecutivos de deficit primário. Ou seja, mesmo desconsiderando os gastos com juros da dívida pública, falta dinheiro para pagar as contas. Isso faz com que o governo precise, todo ano, pegar mais empréstimos para zerar o deficit.
A consequência é o crescimento da dívida pública. No final de 2013, último ano em que o Brasil registrou superavit primário, a dívida pública líquida era de cerca de 30% do PIB (Produto Interno Bruto). No fim de 2018, chegou a 53%. E com novos deficits primários, a tendência é que a relação dívida/PIB aumente nos próximos anos.
A situação das contas públicas é um dos principais problemas para o novo governo. Nesse contexto, instituições de análise fiscal ligadas à Câmara e ao Senado divulgaram no fim de 2018 documentos em que traçam cenários e avaliam as dificuldades que o governo terá na gestão do Orçamento.
O Nexo mostra algumas das conclusões do “Relatório de Acompanhamento Fiscal” da IFI (Instituição Fiscal Independente) e do “Projeções orçamentárias: cenários para 2019-2023 no contexto de tetos de gastos”, da Consultoria de Orçamento da Câmara.
Os gastos obrigatórios seguirão crescendo
O governo tem, desde 2017, um mecanismo de controle do gasto público. A Emenda Constitucional 95, conhecida como a do “teto de gastos”, define um limite para a despesa do governo federal a cada ano.
Pelo teto, as despesas só crescem reajustadas pela inflação. Na prática, isso significa um congelamento do gasto por até 20 anos. A questão é que o teto só congela o gasto total, não tem poder algum sobre o crescimento das despesas obrigatórias, que crescem ano após ano. Isso acontece, por exemplo, pelo aumento no número de aposentados.
Ano a ano, mesmo que o governo não crie novas despesas, as obrigatórias vão continuar crescendo, diminuindo os recursos que o Poder Executivo pode remanejar. Em 2023, pela projeção do estudo da Comissão de Orçamento da Câmara, não haverá dinheiro para os gastos discricionários como investimentos em infraestrutura. Só as obrigatórias serão maiores que o limite do teto.
“A existência de um teto fiscal, por si só, não tem o condão de alterar a legislação vinculante do gasto obrigatório. Desse modo, a viabilidade da premissa de queda de despesa primária depende de uma avaliação mais detida acerca das despesas obrigatórias, que têm suas lógicas próprias de crescimento e por certo não se limitam ao ritmo da inflação”
Renúncias tributárias seguem em nível alto
O governo federal concedeu, ao longo do tempo, uma série de isenções e desonerações para setores da economia. O estudo da Câmara estima que o governo abriu mão de arrecadar, somente em 2018, R$ 270 bilhões. O valor seria suficiente para zerar o deficit primário, que deve ficar perto dos R$ 150 bilhões em 2018, e ainda gerar um superavit. Para 2019, a projeção é de R$ 306 bilhões.
Os chamados gastos tributários vão desde isenções dadas para organizações sem fim lucrativo até o sistema de cobrança de impostos definido pelo Simples Nacional - voltado para micro e pequenas empresas. As deduções e isenções da declaração do Imposto de Renda também entram na conta, são contabilizadas como recursos que o governo abre mão de arrecadar. A Zona Franca de Manaus também está na conta.
Dívida líquida cresce
O Brasil terminou o mês de outubro de 2018 com uma dívida líquida de R$ 3,6 trilhões. Segundo a Instituição Fiscal Independente, é a maior proporção em relação ao PIB desde 2006.
A dívida é alimentada pelo deficit que o governo segue acumulando. Somente nos 12 meses entre novembro de 2017 e outubro de 2018, faltaram R$ 488 bilhões para o governo. O resultado nominal leva em conta os gastos primários do governo e também o pagamento de juros da dívida pública.
Graças à redução da taxa básica de juros da economia, que também impacta a dívida do governo, a dívida pública, apesar de crescente, tem custado menos aos cofres públicos do que no auge da crise, entre 2015 e 2016. O deficit nominal, que agora está em 6,8% do PIB, ultrapassou os 10% no início de 2016 quando o Brasil tinha, além de deficit primário, uma taxa Selic de 14,25% ao ano.
Superavit só volta em 2023
A IFI também fez projeções para o resultado primário do governo federal nos próximos anos. No chamado cenário base, o governo vai arrecadar mais do que gasta somente em 2023. Mas a concretização desse cenário depende de um crescimento significativo da economia.
O cenário do Relatório de Acompanhamento Fiscal projeta que o PIB cresça seguidamente nos próximos quatro anos a taxas que variam entre 1,4% e 2,4%. O superavit só aconteceria com a combinação de um aumento na arrecadação do governo, graças a um crescimento da economia, e ao congelamento dos gastos.
O gráfico abaixo traz as receitas e as despesas do governo como proporção do PIB. Ou seja, se a economia crescer e o gasto se mantiver congelado, ele vai representar uma proporção menor do PIB. O inverso vale para a receita que, se mantida fixa como proporção, vai representar uma quantidade de dinheiro maior com o crescimento da economia.
Fonte: NEXO
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