A tentativa do presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL) de votar parte da reforma da Previdência Social foi vista com desconfiança pelos líderes políticos da Câmara dos Deputados e rechaçada até por aliados próximos do futuro governante. Três fatores pesam contra essa articulação: 53% dos deputados não voltarão em 2019 e tem poucos motivos para assumirem mais um desgaste com os eleitores; o prazo para votar em dois turnos nas duas Casas é curtíssimo, de no máximo sete semanas; a intervenção federal no Rio de Janeiro precisaria ser suspensa para votar a proposta de emenda à Constituição (PEC).
Eleito para uma vaga para o Senado, o deputado major Olímpio (PSL-SP), que foi coordenador da campanha de Bolsonaro em São Paulo, disse não acreditar que a reforma tenha apoio suficiente neste ano e que, se for pautada, ele mesmo votará contra. Outro dos principais aliados do presidente eleito no Congresso, o deputado Alberto Fraga (DEM-DF), que não foi reeleito, disser ser inviável votar este ano "porque o texto que aí está é conhecido e não houve aceitação pelos parlamentares". "A gente falar em um novo texto é impossível. Caso seja apresentado um novo texto, a responsabilidade tem que ficar com o novo Congresso. Deputados que não se reelegeram, se votarem a reforma, podem receber a pecha de ter aprovado por retaliação. Isso é ruim, porque a vida pública continua", afirmou.
Os deputados que não foram reeleitos, que são maioria este ano, têm resistências a votar o projeto. Segundo relatos, quem já perdeu a eleição já está pensando em 2020 e não quer ficar com o desgaste de, no apagar das luzes, votar uma proposta impopular. Dentro do governo, a avaliação é de que a fala de Bolsonaro serviu mais para tentar acalmar o mercado após declarações desastradas de parte de sua equipe do que uma intenção real.
O líder do PPS na Câmara, Alex Manente (SP), defendeu a necessidade de uma reforma da Previdência, mas que o texto atual não resolve o problema das desigualdades e nem o déficit público. Lembrou ainda que o indicado para ministro da Casa Civil, deputado Onyx Lorenzoni (DEM-RS), passou o dia ontem dizendo que a reforma do presidente Michel Temer é um "remendo" e que a tendência era encaminhar um texto novo em 2019. "O próximo governo ainda não decidiu o que pretende votar até o fim do ano. Se eles não sabem, a gente muito menos", disse.
O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), afirmou que o país precisa de uma reforma da Previdência e que está aberto a dialogar com o futuro governo sobre isso, mas que só o presidente eleito terá capacidade de liderar a mobilização para aprova-la. Ele procurou não alimentar expectativas. "Abrir prazo para votação agora seria o mesmo erro que tivemos no passado. Olhando para trás, era óbvio que o governo do presidente Michel não tinha mais as condições de votar a reforma", disse.
Na opinião do líder do governo Temer, o deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), é o futuro presidente que precisa se movimentar, que "está com a bola". "A reforma do governo Temer foi discutida durante dois anos, aprovada na comissão e não foi votada no plenário. Ponto. Não acho que agora, depois da eleição, seja o momento do governo Temer tentar vota-la", disse. Ele também defendeu que quem precisa definir o qual parte da PEC seria votada é o futuro governo, mas que até agora está batendo cabeça sobre votar ou não a reforma.
Relator da reforma da Previdência proposta por Temer, o deputado Arthur Maia (DEM-BA) é um dos mais otimistas sobre as possibilidade de aprovar o texto ainda este ano, mas também diz que isso dependerá do presidente eleito criar o clima para isso. Já o regime de capitalização, proposto durante a campanha por Paulo Guedes, que ficará a frente do Ministério da Economia, é inviável economicamente. "O rombo hoje é de R$ 200 bilhões por ano e vai aumentar se os novos participarem só do regime de capitalização. Como é que vamos fazer a transição?", questiona.
No atual modelo, de repartição, os trabalhadores da ativa sustentam os aposentados e pensionistas. No de capitalização cada trabalhador faz sua própria poupança e o governo garante uma renda mínima. Para o presidente da Câmara, a migração, se for só para os novos, seria facilmente aprovada, mas não resolveria o problema do déficit.
Fonte: Valor Econômico
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