Indignados, assistimos à votação do Projeto de Lei 4.302/1998 (!!!!!) na noite de 22 de março de 2017. Lamentavelmente, a Câmara dos Deputados conseguiu aprovar a terceirização sem limites, em manobra que ressuscitou um projeto que estava engavetado, para contornar a ‘demora’ do Senado em apreciar o PLC 30/2015, que trata do mesmo tema e também foi aprovado pela Câmara.
Foi aprovada, na prática, a verdadeira reforma trabalhista, para pior. A reforma que desconstrói a Consolidação das Leis do Trabalho – CLT e vários artigos da Constituição Federal Cidadã, que abre portas para o aprofundamento da precarização geral das condições de trabalho, para o rebaixamento de salários, para o aumento da sonegação de direitos trabalhistas e consequente judicialização por parte dos trabalhadores.
O projeto aprovado, que agora vai à sanção presidencial, é muito pior do que o PLC 30/2015. O texto isenta o tomador de mão de obra de fiscalizar se a empresa fornecedora de empregados cumpre as obrigações trabalhistas. Livra o tomador de se responsabilizar pelo pagamento dos direitos trabalhistas caso a fornecedora não os cumpra. O verdadeiro empregador fica desobrigado em relação aos trabalhadores. Lucro máximo, direitos mínimos. O texto prevê apenas a responsabilidade subsidiária, que é muito leve e dificulta a cobrança de direitos por parte dos trabalhadores.
O setor público é tão afetado quanto o privado. Sabemos muito bem o significado disso. Está decretado o fim dos concursos públicos, está autorizado o clientelismo, a generalização das indicações políticas, os loteamentos de cargos. A situação de várias carreiras, já crítica, como a Auditoria-Fiscal do Trabalho, poderá se agravar.
As consequências da decisão dos parlamentares serão muitas e conhecidas ao longo do tempo. Hoje são 12 milhões de trabalhadores terceirizados e cerca de 35 milhões que têm Carteira de Trabalho assinada. Em um curto espaço de tempo a situação poderá ser invertida em proporção ainda maior. As justificativas de que haverá criação de empregos é enganosa, pois os empregos criados serão precários, de baixa qualidade e alta rotatividade, que será ainda mais estimulada com as novas regras para o trabalho temporário. A falta de cuidado com o treinamento e formação dos terceirizados agravará o quadro de acidentes de trabalho que já atinge, hoje, oito trabalhadores terceirizados em cada dez ocorrências.
A terceirização poderá ser um tiro no pé do próprio governo, que parece não ter feito contas básicas. A massa salarial tende a cair drasticamente, impactando fortemente a arrecadação da Previdência Social e do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS. Não gera empregos, não reduz desigualdades, não produz trabalho decente, não erradica a pobreza nem o trabalho escravo e infantil.
A terceirização sem limites e o trabalho temporário, aliados às propostas contidas nos projetos de reforma Trabalhista e Previdenciária, terminarão por exterminar os direitos trabalhistas, o direito à aposentadoria, a assistência social no Brasil. Um retrocesso estarrecedor. Se levado a cabo, custará à sociedade, às empresas, ao sistema produtivo, todos os setores, sem exceção. Trabalhadores levarão décadas em busca de recuperar direitos, com muita luta e resistência, sem qualquer garantia de êxito.
Do ponto de vista da Fiscalização do Trabalho, a terceirização está legalizando o que é ilegal. Para os Auditores-Fiscais do Trabalho muda o foco da fiscalização das empresas atualmente constituídas, para as milhares de empresas intermediadoras de mão de obra que certamente surgirão. Esses agentes do Estado tentarão garantir que os direitos correspondentes aos míseros salários pagos aos empregados, cujo vínculo verdadeiro é com outra empresa onde ele presta serviço, sejam respeitados e garantidos.
Com um efetivo extremamente reduzido para a fiscalização e expectativas pouco animadoras quanto à mudança deste quadro para melhor, trabalhadores e servidores públicos estarão à mercê dos empresários – tomadores e intermediadores.
A reação precisa ser muito forte, imediata e ampla. Trabalhadores, servidores públicos, cidadãos, juntos, para que não prosperem mais medidas de precarização e extinção de direitos. Na rua, nos locais de trabalho, em todos os fóruns de denúncia e resistência, dentro e fora do país.
Por fim, o Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho (Sinait) espera que o presidente da República Michel Temer vete a lei integralmente, mostrando sensibilidade e respeito a direitos que são a própria dignidade e cidadania do trabalhador brasileiro.
Carlos Silva
Presidente do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho
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