Auditoria Cidadã da Dívida
25/7/2017
Hoje os jornais alegam que a dívida pública federal (interna e externa) cresceu R$ 245 bilhões no primeiro semestre, tendo atingido R$ 3,35 trilhões ao final de junho, devido aos gastos sociais, com Previdência Social, por exemplo, e que por isso o governo está aumentando tributos para tentar cobrir o déficit orçamentário. Será verdade?
Inicialmente, é preciso ressaltar que as estatísticas oficiais ocultam parte tanto do estoque como do montante de gastos com a dívida. Tal valor de R$ 3,35 trilhões OMITE a parcela de títulos da dívida em poder do Banco Central (BC), que no final de maio já estava em R$ 1,6 trilhão ! Desde 2008, o Tesouro passou a emitir títulos à vontade e entregá-los ao BC, de graça, ou seja, sem
qualquer contrapartida para o país. Portanto, uma dívida questionável e ilegítima, que surge do nada, ou seja, sem que o Tesouro tenha recebido o empréstimo inicial.
O Tesouro Nacional não contabiliza esse item no estoque da dívida divulgado à imprensa, sob argumento de que seria uma dívida com um outro ente público. Porém, o BC pega a maior parte
destes títulos e entrega aos bancos, o que na prática corresponde à remuneração de toda sua sobra de caixa, pagando-lhes juros altíssimos. São as chamadas “Operações Compromissadas”
que já alcançam R$ 1,1 trilhão! Portanto, trata-se de dívida pública federal interna, que remunera generosamente os bancos privados com dinheiro público. Desta forma, a dívida pública interna
federal total já chegou a R$ 4,728 trilhões em maio deste ano (o dado de junho será divulgado no final deste mês). Observe que esse dado é referente à dívida interna e não considera a
estatística da dívida externa federal.
Outro problema das estatísticas oficiais é que não se divulga o montante de juros pagos (pois a maior parte deles é contabilizada como “rolagem”), razão pela qual temos de estimar tal valor.
Tomando-se como base a taxa de juros média anual incidente sobre a dívida interna federal nos últimos 12 meses (calculado pelo Tesouro Nacional em 11,5% ao ano), vemos que, sobre esta
dívida de R$ 4,728 trilhões, deve ter incidido juros de, aproximadamente, R$ 270 bilhões no primeiro semestre, sem contar as amortizações (pagamento do principal da dívida). Portanto,
somente os juros (e não a Previdência) já explicam MAIS QUE TODO o crescimento da dívida apontado pelos jornais no primeiro semestre.
Outro gasto com a dívida pública – também ignorado pelos jornais – é a cobertura dos prejuízos do Banco Central, que em 2016 perdeu R$ 250 bilhões, devido principalmente à desvalorização
das reservas internacionais (resultante da queda do dólar). Segundo a Lei Complementar 101/2000 (curiosamente chamada de “Lei de Responsabilidade Fiscal”), tais prejuízos representam dívida do Tesouro para o Banco Central, ou seja, devem ser cobertos pelo Tesouro, sem limite algum. Ou seja, mais uma dívida que surge do nada, isto é, sem que o empréstimo inicial tenha sido recebido pelo Tesouro.
Somente até 6 de julho deste ano, o governo federal já pagou ao Banco Central R$ 113,6 bilhões. E o pior: quando o Banco Central registra lucros, e repassa estes lucros ao Tesouro, este último
tem de destinar tais recursos para o pagamento da questionável dívida pública.
Portanto, somando-se os juros estimados no primeiro semestre (cerca de R$ 270 bilhões) mais a cobertura de parte dos prejuízos do BC em 2016 (R$ 113 bilhões), já são R$ 383 bilhões de gastos com a dívida pública em 2017, isto sem contar as amortizações (pagamento do principal) da dívida.
Tais custos com amortizações são constantemente desprezados por analistas que não compreendem essa manobra, alegando que tais valores são pagos mediante a emissão de novos títulos, e por isso representariam apenas a chamada “rolagem” da dívida, ou seja, seria apenas a troca de títulos antigos por novos. Porém, analisando-se os dados do Tesouro, verificamos que neste ano (até 6 de julho) já foram destinados R$ 72 bilhões para amortizações da dívida, com recursos que nada tem a ver com emissão de novos títulos, mas sim, provenientes de lucros de
estatais distribuídos ao governo e recebimentos de juros e amortizações de dívidas, principalmente dos estados e municípios, que cortam seus respectivos gastos sociais para pagar
as também questionáveis dívidas com a União.
Desta forma, já contabilizamos R$ 455 bilhões de pagamentos efetivos da dívida pública neste ano, somente até 6 de julho, sem nem contar a chamada “rolagem”. Assim, não é estranho
verificar que o montante de gastos com a dívida (inclusive o refinanciamento ou “rolagem”) foi de R$ 752 bilhões, conforme mostram os dados oficiais do Senado Federal. (disponíveis
em https://goo.gl/Wvlp6g )
Tais R$ 752 bilhões representaram nada menos que 50,17% de todos os gastos federais, sendo que, mesmo desconsiderando-se a “rolagem”, ainda assim tal percentual seria de 38%, um
absurdo, totalmente incompatível com o discurso dos jornais, de que a dívida cresce devido a um exagero de gastos com a Previdência…
Além do mais, mesmo a “rolagem” deve ser considerada como custo, pois caso tais dívidas ilegítimas não existissem, tais novos empréstimos (atualmente destinados para o pagamento de
amortizações) poderiam ser sim destinados a investimentos sociais, que gerariam sua própria capacidade de pagamento, com o consequente crescimento econômico e da arrecadação. Mas
atualmente, a capacidade de endividamento do país está sendo destinada para pagar a própria dívida, que cresce sem contrapartida e sem limite.
AUDITORIA JÁ
Fonte: Auditoria Cidadã da Dívida
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