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A Lei de Responsabilidade Fiscal sob análise do Supremo Tribunal Federal: mais uma vez os Servidores públicos pagarão a conta?

  • 02 de julho de 2019
Em 29 de junho de 2000, o Partido Comunista do Brasil (PCdoB), o Partido Socialista Brasileiro (PSB) e o Partido dos Trabalhadores (PT) ajuizaram Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 2238 para questionar a então recém-aprovada Lei Complementar nº 101 de 2000 - também conhecida como Lei de Responsabilidade Fiscal.
 
Entre os argumentos levantados para apontar a inconstitucionalidade da lei, argumentou-se que, além de não terem sido observados os trâmites devidos do processo legislativo e a suposta regulação parcial do art. 163 da Constituição da República, diversos dispositivos da Lei seriam incompatíveis com os mandamentos inscritos na Constituição.
 
A resolução de mérito da ADI estava inclusive pautada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) para a quarta-feira, 26 de junho de 2019. Adiado, o seu julgamento ficou, agora, para o segundo semestre deste ano. Sua história, contudo, é longa, e seus impactos podem ser profundos para os servidores, especialmente num contexto de crise econômica e fiscal.
 
Entre os dispositivos questionados, porém, um é de maior interesse para os servidores. É que o art. 23 da Lei de Responsabilidade Fiscal prevê, em seu parágrafo 3º, que “é facultada a redução temporária da jornada de trabalho com adequação dos vencimentos à nova carga horária”, em uma tentativa de regulação do art. 169 da Constituição da República, que por sua vez estabelece os limites máximos para os gastos com pessoal dos entes federados e, também, as medidas a serem tomadas para o seu cumprimento.
 
Nesse sentido, sustenta-se a inconstitucionalidade desse dispositivo legal em três pontos principais. O primeiro é a extrapolação de competência do art. 169 pela LC nº 101, pois o art. 169 contém rol taxativo de medidas que podem ser tomadas em caso de se exceder o limite legal de gastos com pessoal. Ao estabelecer uma outra medida que não está expressamente disposta pela Constituição, a LC nº 101 vai além do permissivo constitucional.
 
O segundo, e talvez o mais controverso ponto, diz respeito à irredutibilidade de vencimentos, prevista no art. 37, XV[4] da Constituição, salvo exceções dispostas pelo próprio texto constitucional. Assim, a diminuição unilateral de carga horária implicaria em forma velada de reduzir os vencimentos dos servidores públicos, inaceitável se considerada a proteção constitucional dos salários. Ademais, mesmo que se admitisse a alteração da carga horária, o art. 39, § 3º[5]  da Constituição estabelece que a sua redução só poderia ser feita com anuência do servidor.
 
Por fim, o terceiro argumento diz respeito à aplicabilidade da pretendida redução. Pela leitura do art. 169 - em especial do §3º - percebe-se que as medidas ali elencadas visando dar cumprimento aos limites de gastos de pessoal referem-se exclusivamente aos servidores ocupantes de cargos em comissão e de confiança, que devem ter seus gastos reduzidos em 20%, e aos servidores não-estáveis, que podem ser exonerados. Nesse sentido, mesmo que se considere possível a redução da carga horária para atingir o limite constitucional, ela só poderia acontecer para esse grupo específico de servidores.
 
Em consequência da complexidade da ADI proposta, até mesmo pela grande quantidade de dispositivos impugnados, a primeira decisão no processo veio apenas em 2007, com a decisão em definitivo da medida cautelar. Na oportunidade e por unanimidade, os ministros decidiram pela suspensão dos efeitos do §3º do art. 23, apoiando-se inclusive na argumentação aqui apresentada - especificamente sobre a irredutibilidade de vencimentos e a extrapolação dos limites constitucionais dispostos no art. 169.
 
Vários acontecimentos delongaram a decisão final sobre o mérito do processo - entre eles o falecimento do saudoso Ministro Teori Zavascki, cuja morte prematura, para além da verdadeira tragédia para o mundo jurídico, dificultou a pretensão inicial de julgar a ADI ainda em 2016, em um momento no qual as circunstâncias e entendimentos referentes ao §3º do art. 23 não apresentavam sinais de que se afastariam da inconstitucionalidade declarada por unanimidade em 2007.
 
Entretanto, nos anos transcorridos desde então, a crise fiscal dos entes federados e a crise política que atravessou o país culminou em uma vulnerabilização de determinados entendimentos que, outrora, pareciam seguros aos servidores.
 
Com efeito, em 4 de fevereiro de 2019, o governador do estado de Goiás, Ronaldo Caiado, entregou à presidência do Supremo Tribunal Federal carta na qual as secretarias de Fazenda de diversos estados ( Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Goiás, Paraná, Pará, Alagoas e Mato Grosso do Sul) solicitam o retorno da medida que estabelece a possibilidade de redução de jornada e, consequentemente, de proventos de servidores[6].
 
Em decorrência da alegada necessidade de ajuste fiscal, o funcionalismo público tem sido sempre o segmento mais atingido pelas medidas econômicas de austeridade adotadas pelos governos. Nesse sentido, a partir da carta entregue à presidência do STF, diversos representantes dos Poderes Executivos estaduais tomaram posição oficialmente na controvérsia, na tentativa de fortalecer a tese da necessidade de se decidir pela da constitucionalidade dos dispositivos aqui discutidos.
 
Em contrapartida, a posição dos servidores no julgamento da ADI se mostra fragilizada. Isso porque um tema de tamanha importância não tem participação dos servidores, sendo poucas as entidades com representação admitidas como amigas da corte, muito embora seja expressiva a participação dos Ministérios Públicos Estaduais e, agora, também a pressão dos estados no sentido obter autorização para a redução da jornada e da remuneração dos servidores.
 
Isso é importante, pois a definição da constitucionalidade da redução da carga horária, com consequente redução de salários, implica na possibilidade de o Executivo decidir, unilateralmente, por reduzir a prestação ou a qualidade de serviços, reduzindo também o número de servidores à disposição sem que haja a diminuição da demanda, sobrecarregando o funcionalismo público.
 
A movimentação dos estados acima referidos, na defesa da constitucionalidade dos dispositivos enfrentados, está alinhada com uma perspectiva de desvalorização do servidor público – que é visto mais como uma “rubrica orçamentária[7]” do que como um trabalhador imprescindível para a prestação de serviços.
 
No entanto, ao mesmo tempo em que se aposta na redução das despesas de pessoal, adere-se também a uma política de benefícios e desonerações fiscais, que revela que a necessidade do equilíbrio orçamentário não é um objetivo em si, mas uma pretensão mais ampla de redução generalizada do estado e das suas intervenções no mercado, sendo, portanto, parte de um programa neoliberal de desestatização e privatização”.[8]
 
No contexto de crise econômico-financeira, “o capital financeiro tem exigido dos estados a adoção de medidas de austeridade que impõem severas restrições nas despesas primárias, privilegiando os mecanismos de pagamento da dívida pública e seus encargos. Exemplo disso, no Brasil, é a recente aprovação da Emenda Constitucional 95 de 2016, que impôs limites especiais aos gastos públicos a todos os entes federados e poderes (Executivo, Legislativo, Judiciário), além do Ministério Público e Defensoria, nos próximos 20 anos, no que diz respeito às despesas primárias, isto é, os gastos com folha de pessoal, saúde, educação, previdência, assistência social e cultura. Enquanto isso, o orçamento público fica à disposição das despesas financeiras, que referem-se ao pagamento dos juros da dívida externa e interna do país, com os bancos, empresas e governos de outros países “a adoção de medidas de austeridade que impõem severas restrições nas despesas primárias, privilegiando os mecanismos de pagamento da dívida pública e seus encargos”[9].
 
Nesse sentido, os cortes de orçamento sempre são realizados sobre os investimentos sociais e, recentemente e de forma contundente, na previdência social e nos vencimentos dos servidores - ainda que seja destinado mais de R$ 1 trilhão para juros e amortização de uma dívida cuja composição ainda é obscura[10]:
 
Assim, movimentações legislativas como a Emenda Constitucional (EC) nº 95 de 2016, impondo limites aos gastos públicos com despesas primárias de todos os entes federados e poderes, e a movimentação política dos governadores para aprovar dispositivo claramente em conflito com o sistema constitucional de proteção aos direitos fundamentais, são indicativos de que as medidas de austeridade, em verdade, são maneiras de privilegiar o constante rendimento da dívida pública, em detrimento da proteção e prestação do Estado para seus cidadãos.
 
A irredutibilidade de vencimentos é parte integral da dignidade do trabalhador, seja ele servidor público ou não, e a existência continuada de serviços básicos da população depende dessas mulheres e homens que, como o nome bem diz, servem a coisa pública em prol de todos.
 
Espera-se, portanto, que o STF continue na defesa das garantias fundamentais, - que é a defesa da própria "Constituição Cidadã" da República de 1988 - não aderindo à crise forjada do Estado Social e inaugurando uma "jurisprudência da crise", que, se inicialmente justifica-se na excepcionalidade, não passa, na verdade, de definir o modelo constitucional de Estado e de sociedade que se pretende preservar.
 
Fonte: Fenafisco
   
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