Dúvidas e divergências relacionadas à reforma trabalhista estão gerando impasse nas negociações entre empregados e empregadores. A dificuldade para o entendimento aparece com mais força nas convenções coletivas, realizadas entre sindicatos laborais e patronais.
Dados do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) indicam que, de janeiro a abril de 2018, apenas 447 convenções foram concluídas, o equivalente a redução de quase 42,9% em relação a igual período de 2017. No caso dos acordos coletivos, celebrados entre sindicatos e uma ou mais empresas e menos amplas do que as convenções, foram 3.402, queda de 27,2% sobre o intervalo de janeiro a abril do ano passado.
Levantamento do Salariômetro, da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe), mostra quadro semelhante, embora sem abril. No primeiro trimestre, foram 2.557 acordos e convenções coletivas fechados no país, diminuição de 40,1% sobre igual período de 2017. No Estado, a retração é de 26,3%.

O ponto mais polêmico envolve o financiamento dos sindicatos de trabalhadores. Pela legislação anterior, havia a previsão de que o valor arrecadado pelas entidades era descontado do empregado. Tratava-se da contribuição sindical obrigatória, equivalente a um dia de salário do trabalhador no ano.
A partir da reforma, o desconto é feito só se o funcionário formalizar essa intenção na empresa. O Ministério Público do Trabalho (MPT) avalia que essa decisão não precisa ser individual. Poderia ser por meio de assembleia-geral.
Representante regional da Coordenadoria Nacional de Promoção da Liberdade Sindical do MPT, o procurador Gilson Luiz Laydner de Azevedo relata que, diante da falta de segurança jurídica e da oposição de entidades patronais em torno das contribuições, as negociações emperram. O advogado Flávio Obino Júnior, consultor trabalhista da Fecomércio-RS, estima que 80% dos casos de impasse são relacionados a essa questão.
– As negociações estão represadas principalmente pela contribuição negocial. Sindicatos de empregados insistem em regra de contribuição que atinja todos os representados, sem autorização individual. E as entidades (patronais) não concordam – diz Obino.
A economista Daniela Sandi, do Dieese no Estado, observa que as rodadas de negociações têm sido mais longas. A demora é relacionada a pontos controversos da reforma trabalhista (em vigor desde novembro de 2017, mas alvo de questionamentos na Justiça), como homologações das demissões pelos sindicatos e, em especial, o financiamento das entidades laborais. Com menos recursos, elas tenderiam a perder poder para negociar em nome dos interesses das categorias.
– Sem recursos financeiros, as entidades que representam os empregados perdem a capacidade para se manter e, consequentemente, de organização e mobilização, o que abre caminho para que empresas avancem sobre direitos e ampliem ainda mais o processo de precarização das relações de trabalho, reduzindo também os salários – argumenta Daniela.
Supervisor do Sistemas de Acompanhamento de Informações Sindicais do Dieese, Luis Ribeiro entende que as negociações estão mais arrastadas por conta da insegurança jurídica gerada pela reforma.
– As convenções abrangem mais acordos e cláusulas sociais, conjunto mais amplo de garantias. Caíram quase à metade e têm a ver com a reforma. Nos acordos, são questões mais específicas – diz Ribeiro.
Segundo o vice-presidente do Sindicato das Indústrias da Construção Civil do Estado e coordenador da Comissão de Política e Relações do Trabalho da entidade, Rafael Lonzetti, para organizações laborais com comprovada atuação na defesa da categoria não será difícil convencer representados a contribuírem:
– Quem representa a sua categoria de verdade, tem de sobreviver. Somos favoráveis à existência de sindicato laboral representativo.
Ele avalia ainda que um dos princípios da reforma trabalhista, de prevalecer o acordado sobre o legislado, tem sentido apenas se houver, na ponta dos empregados, uma entidade com força de negociação.
Apesar do número menor de negociações fechadas, aumentou o percentual de acordos que acabaram com as categorias obtendo reajuste real. Levantamento do Salariômetro, da Fundação
Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe), mostra que, no primeiro trimestre, em 85% dos casos foram conseguidos aumentos acima da inflação. No mesmo período do ano passado, o percentual ficou em 57%.
Para o supervisor do Sistemas de Acompanhamento de Informações Sindicais (Sais) do Dieese, Luis Ribeiro, os dados refletem a inflação mais baixa e o nível da economia um pouco melhor do que no primeiro trimestre de 2017.
– Os indicadores econômicos (no primeiro trimestre) ao menos se estabilizaram. Pararam de piorar – avalia Ribeiro.
Os dados do Dieese, que chegam até abril, captam movimento parecido. Pelas estatísticas do órgão, 75% das negociações no primeiro quadrimestre conseguiram aumento real. O indicador utilizado é o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC).
Sem acerto entre as partes, a questão poderá ser levada para a Justiça do Trabalho e é ajuizada ação de dissídio coletivo.
O Judiciário decidirá, então, a questão.
Há ainda a possibilidade, mesmo que rara, de não ser feita nova norma coletiva, conforme a característica da categoria.
A partir da reforma trabalhista, este é um ponto controverso e que deve ser discutido na Justiça.
Até novembro do ano passado, quando a nova legislação entrou em vigor, o entendimento do Tribunal Superior do Trabalho (TST) era de que benefícios e vantagens dos trabalhadores existentes na norma coletiva anterior (fruto de convenção coletiva, acordo coletivo ou sentença do judiciário) valiam até ser definida a nova.
A partir da reforma, em caso de impasse, esses benefícios não se mantêm com o fim da vigência na norma, explica o procurador do MPT Gilson Luiz Laydner de Azevedo.
As vantagens vão depender do desfecho da negociação ou de decisão judicial.
Pela Constituição, a remuneração da hora-extra deve ter adicional de ao menos 50% da hora convencional.
Determinada categoria, entretanto, conseguiu, por convenção ou acordo, percentual de 80%.
A interpretação anterior era de que o adicional de 80% continuaria valendo em caso de impasse, ao fim do prazo de vigência da norma anterior.
Agora, com a reforma trabalhista, o empregador poderia pagar o mínimo constitucional (50%), até definir-se a nova norma.
Por enquanto, há mais insegurança jurídica
Quando há acerto, maioria é com reajuste acima da inflação
Com impasse, vez do Judiciário
O que vale após o fim da vigência da norma coletiva anterior
O exemplo