STF Valida Fim do Regime Jurídico Único: Histórico e Controvérsias
No dia 6 de novembro de 2024, o Supremo Tribunal Federal (STF) retomou o julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 2.135, ajuizada em 1999 pelo PT, PCdoB e PDT, que questionava a validade da Emenda Constitucional nº 19 de 1998 (reforma administrativa do governo FHC). Por maioria de votos, a Corte validou a flexibilização do regime jurídico único (RJU), permitindo que entes federativos optem por outros regimes de contratação, como o celetista, para servidores públicos.
Histórico da ADI 2.135
A controvérsia começou durante a tramitação da PEC 173/95, que deu origem à EC 19/98. Em primeiro turno, a Câmara dos Deputados rejeitou uma proposta que alterava o caput do artigo 39 da Constituição, que previa o RJU. No entanto, o texto apresentado para o segundo turno pelo relator da PEC, deputado Moreira Franco, foi modificado, ignorando a rejeição anterior. Essa manobra foi questionada pela oposição, mas a questão de ordem foi indeferida pelo então presidente da Câmara, Michel Temer.
Após a aprovação do texto adulterado pelo Congresso, partidos de oposição ajuizaram a ADI 2.135 no STF, argumentando que houve fraude ao processo legislativo. A liminar foi concedida em 2007 pelo relator da ADI, ministro Néri da Silveira, suspendendo os efeitos da emenda.
Decisão Final do STF
Retomado em 2021, o julgamento foi marcado por divergências entre os ministros. Enquanto a relatora Cármen Lúcia e ministros como Edson Fachin apontaram a inconstitucionalidade da alteração, a maioria da Corte seguiu o entendimento do ministro Gilmar Mendes, considerando que a mudança no artigo 39 foi de “natureza redacional”, sem prejuízo ao processo legislativo.
O resultado final validou a possibilidade de flexibilização do RJU, com modulação de efeitos para que a mudança afete apenas novos servidores.
Pontos de Controvérsia
- Fraude ao Processo Legislativo: A modificação do caput do artigo 39 foi feita sem aprovação explícita do Plenário, levantando questionamentos sobre a legalidade do procedimento.
- Impactos no Serviço Público: Especialistas apontam que a extinção do RJU pode comprometer direitos trabalhistas, estabilidade e a autonomia dos servidores, expondo-os a maior influência política.
- Divisão Interna: A coexistência de regimes celetista e estatutário pode gerar desigualdades dentro do serviço público.
- Sustentabilidade Previdenciária: A migração de servidores para o regime celetista pode enfraquecer o Regime Próprio de Previdência Social (RPPS).
Repercussões e Desafios
O resultado do julgamento foi criticado por representantes do funcionalismo público e especialistas jurídicos. Para o ministro Luiz Fux, a decisão ignorou os requisitos constitucionais para aprovação de emendas, enquanto Edson Fachin destacou a gravidade da mudança para o modelo de gestão pública.
Wanderlei Wormsbecker, presidente do SINDICONTAS/PR, afirmou que a decisão representa um retrocesso para a administração pública:
“A extinção do RJU fragiliza o serviço público e compromete a defesa do interesse coletivo, abrindo espaço para interferências políticas.”
Conclusão
Embora o STF tenha encerrado o julgamento da ADI 2.135, os debates sobre a decisão continuam. Especialistas sugerem a apresentação de embargos de declaração para esclarecer pontos como:
- A abrangência da flexibilização para novas contratações;
- A relação com o regime previdenciário dos servidores celetistas;
- A manutenção de direitos para servidores de carreiras exclusivas de Estado.
A decisão do STF evidencia a necessidade de fortalecer o processo legislativo e de preservar a autonomia do Judiciário frente a abusos de poder. No entanto, ela também marca um divisor de águas no modelo de gestão pública brasileira, com impactos que ainda serão amplamente debatidos.