Matéria original: Rede Estação Democrática
De Amauri Perusso (Auditor de Controle Externo do Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Sul e Presidente da FENASTC)
Convidado para escrever – e publicar – na RED, atuando como presidente da FENASTC, federação que alcança a representação dos Trabalhadores de 33 Tribunais de Contas do País e que são responsáveis pelo controle Externo Brasileiro, tenho me ocupado em entender – e esclarecer – esse tema da corrupção que, vez e outra, volta a ocupar o debate nacional.
Em geral afirmamos que a corrupção é ato contra o Estado. Contra a Administração Pública. Compreensão insuficiente. Quem pratica corrupção deseja se apropriar de riqueza. Na linguagem popular, dinheiro. Dado objetivo, a corrupção é sistêmica e parte integrante do sistema.
A estruturação econômica e social, de natureza histórica, de um País de economia periférica do sistema capitalista, com desenvolvimento dependente e subordinado, organiza sua sociedade a partir de determinados conceitos e valores, condicionados por esses elementos.
A teoria do homem brasileiro cordial determina que não se radicalize (dado inverídico face aos recentes acontecimentos da vida nacional) e não se afaste do meio social quem têm conduta reprovável. Quando exposto (apanhado e, por vezes preso) indicamos a culpa (apontamos o dedo) mas, não a responsabilidade. Não alteramos o sistema ou construímos institucionalidade para prevenir e impedir atos de corrupção.
As obras de infraestrutura, executadas pelo Estado, tornam-se indispensáveis para garantir a presença e a acumulação das empresas transnacionais (automobilística, por exemplo) e, também, dos grupos econômicos nacionais (sobretudo a partir do Governo de Juscelino Kubitschek). Logo, ligamos corrupção às empreiteiras. Esse pensamento vulgar, parecia explicar todo fenômeno. E, aos desavisados, ainda explica.
Então, o sistema alcançou nova fase. O capitalismo de natureza industrial foi suplantado pelo pessoal das finanças. Vai daí a exploração do Estado (aqui União e os maiores Estados subnacionais, RS dentre estes), que passa a ter como elemento central a dívida pública.
O ganho realizado sobre “papéis” traz menores riscos em relação à produção e melhor se ajusta ao caráter de uma elite que não deseja trabalhar. Lembrando que na maior parte da nossa história trabalhar é para escravizados.
O pagamento de juros (taxa Selic atual de 13,45%, com 8,30 pontos acima da inflação, traduzindo na taxa básica de juros reais) e outras cláusulas são auto alimentadoras das dívidas.
Importante compreender que a venda de títulos públicos se dá por valores bem acima dessa taxa indicativa (Selic), atendendo os humores do mercado, constituindo-se no maior ato de corrupção da história moderna.
A Auditoria Cidadã da Dívida diz que, em 2022, esse elemento de despesa (juros e amortizações) representeou R$ 1,869.468.134.500 (5,1 bilhões por dia). Com uma falsa rolagem, onde são registrados como rolagem pagamentos de juros. Para uma dívida interna de 7,8 trilhões de reais (em 31/12/2022).
Para não causar cizânia àqueles que preferem trabalhar com os números do Banco Central – e considerar somente dívida liquida – que é aquela que despreza os títulos emitidos e que estão em poder do Banco Central do Brasil, verão que os juros e a denominada rolagem alcançaram cifras impressionantes.
Essa dívida não gera qualquer contrapartida para o povo brasileiro.
Você, ainda acredita que a corrupção está nas obras públicas?
Já os recentes acontecimentos, produzidos pelos controladores das Lojas Americanas, talvez seja razoável dizer o maior escândalo financeiro dos últimos tempos – de que se ocupa a mídia na atualidade – coloca em destaque um tema muito mal tratado na vida Brasileira. Vale saber: corrupção sempre é do setor público.
Logo dirá você, prezado leitor, que este articulista anunciou exame de corrupção, quando a mídia não está tratando desta forma. Alguns dizem que é fraude. Outros mencionam uma contabilidade própria dessas operações. Alguns falam em falência do modelo de negócios do Senhor Lemann, baseado na redução de custos e na otimização dos resultados para os acionistas.
Outros, ainda, tenderão a considerar uma operação (quase normal) dentre grandes operadores de mercado e grandes bancos (Bradesco com 5 bilhões de prejuízo).
Aqui está uma questão relevante: quando se trata de fraudar informações contábeis que encobriam valores – que já ultrapassam 42,5 bilhões de reais – e dizem os responsáveis tratar-se de prática com tempo superior a 10 anos, nunca detectados pelas auditorias privadas ou pela CVM, não estamos diante de grave processo de corrupção?
O artigo já segue longo e o tema do caráter da corrupção e seu entendimento exigirá outros escritos.