Grupo com renda anual de R$ 750 milhões a R$ 1 bi paga 1,49% de IR

Grupo com renda anual de R$ 750 milhões a R$ 1 bi paga 1,49% de IR

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Matéria Original: Valor Economia

Contribuintes que têm rendimento médio entre R$ 750 milhões e R$ 1 bilhão ao ano pagam apenas 1,49% de Imposto de Renda em média, segundo dados da Receita Federal obtidos pelo Valor por meio da Lei de Acesso à Informação.

O fisco mapeou a posição de renda de cada um dos mais de 141 mil contribuintes que serão afetados pela proposta do governo que visa taxar a alta renda para compensar a isenção do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF) para quem ganha até R$ 5 mil ao mês. O plano é instituir um IR mínimo para quem ganha acima de R$ 600 mil ao ano.

Segundo os dados da Receita Federal, com base em dados de 2022, três contribuintes declararam renda de R$ 1 bilhão ou mais naquele ano. Esse grupo pagou, em média, 5,54% de Imposto de Renda. Já os sete contribuintes na faixa de renda entre R$ 500 milhões e R$ 750 milhões recolhem 2,77%. Os contribuintes afetados pela taxação mínima foram divididos em 25 faixas. Somando todas as faixas, há a projeção de arrecadação de R$ 25,2 bilhões em 2026, mesmo valor da renúncia fiscal estimada com a isenção para a classe média.

Para alguns especialistas, as alíquotas sobre os mais ricos mostram o quão pouco progressivo é o sistema de tributação sobre a renda no Brasil, tendo em vista que a alta renda utiliza instrumentos isentos de tributação.

Para outros, os dados devem ser avaliados com cautela, pois não refletem a tributação que ocorre nas empresas das quais as pessoas de alta renda são sócias. Esse promete ser um dos pontos de embate no Congresso, no projeto relatado na Câmara pelo ex-presidente Arthur Lira (PP-AL).

Governo elaborou cálculo que soma a alíquota média da pessoa física com a da jurídica

De acordo com os cálculos da Receita, a elevação para 10% da alíquota cobrada dos contribuintes com renda acima de R$ 750 milhões em um ano, prevista na proposta, geraria arrecadação inferior a R$ 500 milhões ao ano, tendo em vista que são poucos os contribuintes bilionários que estão nessa faixa de renda.

A maior arrecadação anual, segundo a Receita, viria dos contribuintes que recebem entre R$ 1,8 milhão e R$ 2,4 milhões ao ano, o grupo que seria o mais afetado pela nova tributação. Para esses, a receita gerada com a tributação adicional seria de R$ 3 bilhões.

Haverá ainda arrecadação adicional com a retenção de 10% dos dividendos na fonte para quem recebe até R$ 50 mil por mês, por empresa, aos investidores brasileiros, ante retenção no mesmo valor para os não residentes, independentemente do valor recebido.

O principal argumento da Fazenda em defesa do projeto, segundo conversas com secretários que elaboraram a proposta, é mostrar que a maior parte da população contribuinte recolhe IR a uma alíquota entre 7,5% e 27,5% de Imposto de Renda, ao passo que a alíquota média dos 141 mil da alta renda que serão afetados pela proposta é de 2,54%.

Integrantes da pasta dizem que, justamente por ampliar a progressividade, a medida compensatória será defendida integralmente na maneira o qual foi apresentado ao Congresso Nacional. Há espaço para “ajustes marginais”, segundo uma fonte, mas sem haver uma desidratação ou até mesmo substituição da taxação da alta renda.

Diferentemente de outros projetos enviados pela Fazenda nos últimos anos, há um entendimento na equipe econômica de que existem poucos argumentos para alterar a medida compensatória. Procurada por meio de sua assessoria de imprensa, a pasta não se manifestou oficialmente.

Além disso, a proposta conta com apoio popular. Uma pesquisa do instituto Datafolha publicada no início deste mês, por exemplo, apontou que a taxação da alta renda nos moldes do projeto tem apoio de 76% da população.

“É muito difícil você ser contra um milionário passar a pagar a mesma coisa que paga uma enfermeira”, disse ao Valor no início do mês o secretário de Reformas Econômicas da Fazenda, Marcos Pinto, um dos idealizadores da proposta.

Para não haver a chamada bitributação com a tributação dos dividendos, tendo em vista que a pessoa jurídica já pagou Imposto sobre a Renda, o governo elaborou um cálculo que vai somar a alíquota média da pessoa física com a da pessoa jurídica. Caso essa soma fique abaixo de 34%, a pessoa física terá de complementar o imposto até chegar a este patamar. Caso ultrapasse, o dividendo retido será devolvido.

“Os dados que pautaram a proposta escancaram a ausência de justiça fiscal e de progressividade da nossa tributação da renda da pessoa física e a ideia de uma tributação mínima atende aos princípios da justiça tributária e da capacidade contributiva”, avaliou Lina Santin, pesquisadora do Núcleo de Estudos Fiscais da FGV.

Para ela, apesar de algumas melhorias serem necessárias, “qualquer projeto que busque atribuir maior progressividade à tributação da renda, focando em uma tributação mínima do topo da pirâmide, está em realidade realizando e atendendo esses preceitos constitucionais, em busca de diminuir as desigualdades”.

“Acho que precisa relativizar um pouco os números, porque essas pessoas já pagaram na pessoa jurídica”, contrapôs Adriano Subirá, auditor da Receita atualmente cedido à Câmara dos Deputados.

Um ponto que tem sido questionado pelos parlamentares é que o IR mínimo a ser recolhido pelas pessoas de alta renda é calculado a partir da comparação com aquilo que foi pago por meio da empresa, considerando que a tributação dessa é de 34%. “Mas essa não é a alíquota efetiva paga pelas empresas”, pondera o auditor. Na prática, elas recolhem algo como 22% a 25% de Imposto de Renda. Assim, a referência deveria ser 25%, opinou.

Outro fator que deveria ser levado em consideração, disse o técnico, é que a tributação das empresas muitas vezes fica abaixo dos 34% porque há desconto de prejuízo contábil e outros ajustes. “Vão fazer diminuir a tributação efetiva, mas não significam que a pessoa está sendo subtributada.” Esse ponto também deveria ser levado em consideração, avaliou.

A tendência é que haja algumas alterações na tributação dos mais ricos, mas não na nova faixa de isenção. A sensação nos corredores do Congresso, segundo Subirá, é que o projeto conta com apoio de perto de 60% dos parlamentares. Há os que são contrários, mas esses avaliam o custo político de se posicionar.

Os números da Receita mostram que a conta do aumento da faixa de isenção será arcada pelas faixas intermediárias entre os mais ricos, observou o auditor. Aqueles que estão no topo da renda encontrarão formas legais de driblar o aumento dos impostos. Por exemplo, reduzindo a distribuição de dividendos.

“É natural que haja maior potencial de arrecadação na faixa entre R$ 1,2 milhão e R$ 3,6 milhões porque há muito mais gente nessa faixa de renda”, comentou o economista Sergio Gobetti, pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). “Os bilionários ou ultramilionários são minoria e poderão pagar individualmente um valor alto, mas que no agregado pouco representa.”

Essa é uma das razões pelas quais não se deve ampliar o início da cobrança do imposto mínimo para a faixa de R$ 1,8 milhão, como proposto pelo PP, comentou. “Muito menos com uma alíquota de só 4%”, acrescentou.

O economista observou que o imposto mínimo tem o efeito de equalizar a tributação entre as pessoas de alta renda, que hoje é muito variável. Os números da Receita mostram que hoje as alíquotas variam de 1,03% a 5,54%, ao passo que a taxa mínima as elevará para a faixa dos 9%.




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