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Nove perguntas para Rubens Ricupero

  • 20 de julho de 2020

Para o ex-ministro da Fazenda, um dos signatários da carta aberta que defende a retomada da economia com preservação ambiental, a iniciativa pode mobilizar a sociedade

Cássia Almeida

1. O senhor já assinou documentos de ex-ministros contra a política externa do governo e contra a atuação do Ministério do Meio Ambiente. Qual a diferença para esta ação de agora que reuniu ex-ministros da Fazenda?

No caso do manifesto dos ex-ministros de Relações Exteriores, era uma resposta à desastrosa política externa que viola a própria Constituição. No caso dos ex-ministros do Meio Ambiente, foi em protesto ao “passar a boiada” (o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, defendeu, na reunião ministerial de 22 de abril, aproveitar a atenção voltada para pandemia para “passar a boiada”, referindo-se à desregulamentação ambiental). Esse terceiro visa mais à ideia de longo prazo, de sair da crise com uma economia mais afeita à economia verde, olhando para o futuro. Não foi propriamente uma crítica ao atual governo, embora tenha acabado aparecendo como tal. A base desse documento é que o Brasil deve fazer como a União Europeia e os democratas do Estados Unidos, trabalhar com uma economia de baixo carbono.

2. Como fazer isso no Brasil?

O problema no Brasil são as queimadas. No caso dos europeus e americanos, o obstáculo maior é a energia elétrica gerada pelo carvão. No caso do Brasil, o maior responsável pelo acúmulo de gases de efeito estufa é o desmatamento, sobretudo da Amazônia e do Cerrado. Não dá para ter como objetivo uma economia de baixo carbono sem colocar isso no topo da prioridade. E é claro que isso é um problema do momento. No governo Bolsonaro, as taxas de aumento do desmatamento estão crescendo a uma velocidade que não era vista havia mais de dez anos. Não é só na Amazônia. É na Amazônia, é no Cerrado, é no Pantanal, é na Mata Atlântica.

3. O que o senhor achou da declaração do ministro da Economia, Paulo Guedes, de que o Brasil preserva mais que outros países?

Parece que foi escrita por um humorista. No mundo inteiro há um clamor. Vejo o que sai no jornal The New York Times, na revista The Economist, no jornal Financial Times. Só se fala disso há semanas. Querer ignorar isso é realmente uma atitude absurda, de enfiar a cabeça na areia. De fato, o Brasil, no passado, estava diminuindo as taxas de desmatamento. Nós estávamos melhorando, mas sempre com taxas de destruição muito grandes. Este governo não tem nenhuma credencial para dizer isso, porque desmantelou tudo. O Ministério do Meio Ambiente é a metade do que era. O corte de verbas foi de mais de 40%, a secretaria que cuidava de mudança de clima foi suprimida. Dentro dessa secretaria havia um departamento que combatia os incêndios, que foi aperfeiçoado durante 30 anos. Havia equipes lá que eram altamente qualificadas. Tudo isso acabou, foi desmantelado. Como conciliar isso com as declarações de Guedes? Será que ele não sabe? Ou, se sabe, ignora deliberadamente?

4. Espera-se uma mudança no comportamento do governo com essa mobilização? Considera possível?

O máximo que podemos almejar é fazer aquilo que é chamado de contenção de danos. Quando você não consegue fazer nada de muito positivo, você pode pelo menos reduzir o prejuízo. Acho que é isso que nós estamos tentando fazer, mobilizar a sociedade. De janeiro a junho, o desmatamento da Amazônia já superou todo o ano passado, que, por sua vez, foi o pior nos últimos oito, dez anos. Fiquei animado com essa iniciativa dos presidentes de mais de 100 empresas (que também reclamaram publicamente da política ambiental). É um documento forte, de grandes empresas exportadoras brasileiras. Vejo nisso, assim como esses fundos de investimento (fundos que reúnem ativos de US$ 4 trilhões pediram providências ao governo brasileiro contra o desmatamento), alguma esperança. Não é a esperança que vai converter o Bolsonaro, ou o Guedes, ou o Mourão (vice-presidente Hamilton Mourão). Eles não vão mudar as ideias que eles têm, mas, pelo menos, ficam com receio das consequências. Por exemplo, esse decreto que proíbe as queimadas por 120 dias. Vamos ver no que vai dar.

5. O que precisa ser feito?

O governo tinha de botar no Ministério do Meio Ambiente um ministro com um compromisso sério, restabelecer a secretaria de combate à mudança de clima, o departamento de combate a incêndio, chamar de volta os fiscais que foram afastados. Se isso não acontecer, é claro que o mundo não vai se convencer da boa-fé brasileira. E vai haver problemas.

“A declaração do ministro da Economia, Paulo Guedes, de que o Brasil preserva mais que outros países parece que foi escrita por um humorista“, disse Rubens Ricupero, que ressaltou o aumento das queimadas. Foto: Carl de Souza / AFP“A declaração do ministro da Economia, Paulo Guedes, de que o Brasil preserva mais que outros países parece que foi escrita por um humorista“, disse Rubens Ricupero, que ressaltou o aumento das queimadas. Foto: Carl de Souza / AFP

 6. Quais problemas?

Uma deputada americana, uma das poucas indígenas, Deb Haaland, muito influente, é autora de uma emenda para revogar a designação do Brasil como um dos principais aliados dos Estados Unidos fora da Otan, que foi uma coisa que Bolsonaro conseguiu quando foi lá (em março do ano passado). Ela tem argumentado que não é tolerável que os Estados Unidos aceitem dar um tratamento especial a um país que está ameaçando a sobrevivência dos povos indígenas. E tudo indica que os democratas vão ganhar a eleição.

7. O que pode acontecer se a política ambiental do Brasil não mudar?

Os problemas vão piorar. Nestes dois anos e meio que restam ao governo, ele vai ter muitos problemas com investimento, com comércio, com países estrangeiros, como acordos como aquele da União Europeia que não vão sair do papel. Este governo inaugurou uma política externa em que a diplomacia é orientada pela afinidade ideológica. É por isso que eles gostam do sujeito da Polônia (o ultraconservador Andrzej Duda), da Hungria (Viktor Orbán), gostam do (Donald) Trump. No final do ano, se Trump for derrotado, vamos ter de lidar com um governo democrata totalmente hostil. Um governo normal não teria permitido que se chegasse a esse ponto, procuraria se aproximar dos democratas, abriria uma ponte.

8. Por isso é importante manter a mobilização?

Sim, porque nós estamos pensando além deste governo. Uma preocupação que nós todos temos nesse grupo é que o Brasil não perca de novo o trem da história. Nas grandes mudanças na economia mundial, tudo isso chegou ao Brasil com muito atraso. Estamos na véspera de uma mudança qualitativa. Os países da União Europeia e os democratas nos Estados Unidos já perceberam que o futuro pertence à economia verde. Um exemplo concreto do que está acontecendo agora: a indústria automobilística do Brasil já está começando a fazer um lobby para convencer o governo a adiar a entrada em vigor dos novos padrões de eficiência dos motores. Na Alemanha, já estão fabricando carros ultraeficientes. Quando estamos falando que é preciso se mover em direção à economia verde, é disso que estamos falando, começar a olhar para essas tecnologias de vanguarda, e não ficar aqui esperando que os europeus nos mandem as máquinas que eles não vão usar mais lá.

9. Quais as consequências dessa situação para a população?

Prejudica em tudo. Em algum momento vai começar a precificar isso no comércio exterior. Atualmente prejudica até o cidadão. O brasileiro é visto como o cidadão de um país que massacra índios, que queima floresta, põe em perigo o clima do planeta, enfim, é visto como uma parte do problema, e não da solução. Até no plano pessoal é desagradável. Eu ouço de colegas meus que estão no exterior que nunca foi tão penoso representar o Brasil como agora. Ficam meio envergonhados. É uma verdadeira cachoeira de acusações. Aqui, as pessoas não se dão conta porque não leem a imprensa internacional. Nossa imagem é péssima hoje. Brasil que não cresce, está em recessão, não tem nada de simpático.

FONTE: ÉPOCA
   
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