No úlitmo dia 26 de junho, a Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro - ALERJ incluiu na ordem do dia a votação das contas do Estado do Rio de Janeiro, a despeito do recurso do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro - MPC/TCE/PR. No dia 30/05/2018, o TCE/PR havia emitido um parecer prévio contrário à aprovação das contas prestadas pelo Governador do Estado do Rio de Janeiro, em razão do não cumprimento dos percentuais mínimos constitucionais de gastos em educação (25%) e saúde (12%), entre outras irregularidades, conforme resumo do voto disponível em https://www.tce.rj.gov.br/todas-noticias/-/asset_publisher/SPJsTl5LTiyv/content/parecer-previo-contrario-as-contas-do-governo-do-estado.
O Ministério Público Especial se posicionou contra a aprovação das operações financeiras, tendo em vista o pagamento de despesas correntes - folha de pagamentos de pessoal - com recursos provenientes de operação de crédito, irregularidade que foi afastada pelo voto do relator. O Ministério Público Especial, ou de Contas, interpôs recurso face à divergência, com fundamento no art. 96, II, do Regimento Interno da Corte.
Em que pese a interposição de recurso pelo Ministério Público, a votação das contas foi incluída na pauta da Comissão de Orçamento da ALERJ no dia 26, tendo restado aprovadas pela mesma, anteriormente à decisão do Tribunal sobre referido recurso. Em seguida, o parecer da Comissão será votado em discussão única no Plenário, na forma de um projeto de decreto legislativo, como prevê os art. 205 e 206 do Regimento Interno da ALERJ.
Deputados teriam dito que o prazo para apreciação das contas do Governador pelo Tribunal (60 dias a contar do seu recebimento) já expirou, ao que se soma o estado de calamidade pública no âmbito da administração financeira do Estado do Rio de Janeiro, o que justificaria a pressa em aprovar as contas.
Segundo o art. 123 da Constituição do Estado do Rio de Janeiro, compete ao Tribunal de Contas do Estado apreciar as contas prestadas anualmente pelo Governador do Estado, na qualidade de órgão auxiliar do titular do controle externo, que é a Assembleia Legislativa, por força do art. 122.
De fato, o parecer prévio emitido pelo Tribunal de Contas sobre as contas anuais do chefe do Poder Executivo tem caráter opinativo, e não vinculativo, como decidido pelo Supremo Tribunal de Justiça no âmbito de Recurso Ordinário em Mandado de Segurança, RMS: 13316 SC 2001/0067818-6.
RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. PARECER PRÉVIO DO
TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE SANTA CATARINA. REJEIÇÃO DAS CONTAS
DO EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 1996 DO MUNICÍPIO DE XANXERÊ.
IRREGULARIDADES DETECTADAS NA PREFEITURA. PEDIDO DE REEXAME ACATADO.
NÃO-OCORRÊNCIA DE ILEGALIDADE OU ABUSO DE PODER. DIREITO LIQÜIDO E
CERTO DO IMPETRANTE NÃO-ATINGIDO. SEGURANÇA DENEGADA.
O Tribunal de Contas, órgão auxiliar do Poder Legislativo, a
propósito das contas do Executivo Municipal, exerce mera função
opinativa, devendo prevalecer, in casu, a decisão política da Câmara
Municipal, no sentido de acatar ou não o parecer prévio emitido por
aquele órgão e, via de conseqüência, aceitar ou rejeitar as contas
de determinado exercício financeiro.
Na hipótese dos autos, não há falar em violação de direito líquido e
certo do impetrante, tampouco em cerceamento de seu direito
constitucional à ampla defesa, posto que, além de ter acatado seu
pedido de reexame das contas pelo corpo técnico do TCE/SC, o mesmo
ainda não foi submetido ao crivo do Legislativo, isto é, a Câmara
Municipal ainda não se pronunciou acerca das contas sub quaestio, a
qual, na ocasião, recebido o parecer prévio e instituída a Comissão,
dará ao impetrante nova oportunidade de defesa e manifestação.
Recurso ordinário improvido.
Contudo, tratando-se o parecer prévio de um instrumento de transparência da gestão fiscal elencado no art. 48 da Lei de Responsabilidade Fiscal, mostra-se precipitada a votação das contas pela ALERJ anteriormente à decisão do Tribunal de Contas quanto ao recurso interposto pelo Ministério Público Especial, desconsiderando a apreciação técnica das contas do governo estadual.
Nesse ínterim, assim se posicionaram o Supremo Tribunal Federal (ADI 261/SC e 3077/SE) e o Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais quanto à inobservância do parecer prévio:
Ação direta de inconstitucionalidade. 2. Parágrafo 3º do art. 113
da Constituição do Estado de Santa Catarina, que permite que as contas
do município sejam julgadas sem parecer prévio do Tribunal de Contas
caso este não emita parecer até o último dia do exercício financeiro.
3. Violação ao art. 31 e seus parágrafos da Constituição Federal. 4.
Inobservância do sistema de controle de contas previsto na Constituição
Federal. 5. Procedência da ação.
Ação direta de inconstitucionalidade. 2. Inconstitucionalidade de norma de Constituição estadual que dispensa
apresentação de parecer prévio sobre as contas de Chefe do Poder Executivo
municipal a ser emitido pelo respectivo Tribunal de Contas Estadual.
Precedentes.
SÚMULA 31 DO TCEMG: É ineficaz e de nenhuma validade a Resolução da Câmara Municipal que aprova ou rejeita as contas do Prefeito antes da emissão do Parecer Prévio do Tribunal de Contas.
Segundo Ferraz (1999) apud Andrada & Barros (2010):
[...] aos Legislativos, no momento de finalizar o processo de julgamento das contas globais do Executivo, não é dado simplesmente ignorar o Parecer Prévio, omitindo-se de julgá-lo ou desprezar seu conteúdo sem expressar, motivada e tecnicamente, as razões pelas quais o fazem. Em qualquer destas duas hipóteses, a conduta do Parlamento será ilícita. Na prática, não se deve olvidar que os Parlamentos são órgãos políticos por excelência, que não raro se apegam às paixões partidárias para apreciar os fatos colocados ao seu crivo. É a partir desta constatação que emerge a importância do Tribunal de Contas ao emitir seu parecer sobre as contas do Chefe do Executivo, objetivando, com a isenção e a imparcialidade típicas destes órgãos colegiados, dar ao indivíduo (prestador) e à sociedade a garantia da escorreita interpretação da Constituição e da Lei.
Considerando as competências atribuídas aos Tribunais de Contas pelo texto constitucional de 1988, em seus art. 71, I, e art. 75, expressamos desacordo em relação à postura da ALERJ, que antecipou a votação das contas de governo a despeito do parecer prévio do Tribunal de Contas, conformando um julgamento estritamente político das contas de governo.
Diretora de Divulgação e Eventos
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