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Um sistema lento e pouco disponível

  • 03 de maio de 2018
Rapidez e segurança. Esses são os desejos de qualquer brasileiro quando indagado sobre o que espera do Poder Judiciário. Nada mais distante da realidade.
 
A solução de um processo judicial leva anos, as execuções de sentenças são raras, e a existência de diferentes posições judiciais sobre os mesmos temas revela a dificuldade de trabalhar com a Justiça em perspectiva.
 
A morosidade desgasta a instituição e os meios oficiais de solução de conflitos. No campo criminal, o largo tempo para uma decisão definitiva leva, por um lado, à prescrição e à impunidade. Por outro, a conjunção da ansiedade por uma resposta estatal ao crime com a falta de uma decisão definitiva incentiva a perigosa antecipação de atos processuais, que só poderiam ocorrer ao final do processo. Prisões preventivas tomam o lugar da pena definitiva. Bloqueios cautelares de bens substituem perdas patrimoniais apenas possíveis no fim do processo.
 
Essa morosidade também afeta a segurança. Quanto mais demorada a resposta definitiva do Judiciário sobre uma controvérsia, menos previsibilidade na Justiça. Se o STF não fixa um entendimento sobre um tema polêmico, cada juiz continuará julgando de acordo com suas convicções pessoais, cada Tribunal terá uma decisão diferente sobre a mesma questão, cada ministro seguirá insistindo em sua tese particular. Isso torna o sistema uma loteria na qual a peça mais importante é o distribuidor, o personagem que define qual magistrado será responsável pelo julgamento de uma causa.
 
Um sistema moroso e inseguro, não é saudável ao Estado de Direito, ao desenvolvimento social, econômico e à democracia.
 
O enfrentamento da morosidade exige o conhecimento de suas causas. Por que a Justiça é lenta no Brasil?
 
Não é por falta de juízes ou de estrutura. Temos 18 mil magistrados e gastamos 1,4% do PIB com o Poder Judiciário, valor maior que diversos países de 1º mundo, como a Alemanha. Também não é por falta de trabalho. Os juízes brasileiros de 1º grau decidem cerca de 1.700 processos ao ano, uma produção acima da média mundial.
 
O problema, em verdade, é o excesso de processos. Em 2016 entraram cerca de 30 milhões de ações no Judiciário, um número que dá a impressão de amplo acesso à Justiça no Brasil.
 
Mas é só aparência.
 
Em verdade, há poucas pessoas que litigam demais no Brasil, enquanto a maior parte dos cidadãos é excluído do sistema formal de solução de conflitos. Mais de 20% desses processos é do INSS, 13% são bancos, e 8,5% tem relação com a Caixa Econômica Federal, a revelar que a grandiosidade do problema é desproporcional ao número de seus causadores.
 
O uso excessivo do Judiciário por alguns poucos personagens pode ser enfrentado pela criação de câmaras de mediação e solução de controvérsias repetitivas, em geral quando digam respeito a questões previdenciárias ou bancárias. Por outro lado, a expedição mais frequente de súmulas pelos Tribunais Superiores ou pelo STF sobre temas repetitivos é um importante passo para afastar do Judiciário milhares de litígios sobre questões idênticas. Por fim, uma melhor regulação das ações coletivas permitiria que inúmeras demandas individuais se transformassem em poucos processos coletivos, facilitando sua tramitação e julgamento.
 
Mas o excesso de litígios não é o único problema. Para além da alta entrada, há pouca saída para os casos judiciais. Um sistema burocrático e atrasado de gestão de processos dificulta sua tramitação.
 
A Emenda Constitucional 45 abriu caminho para acelerar o andamento dos casos na Justiça. Previu a duração razoável do processo como direito fundamental. Dificultou que discussões judiciais sejam levadas até a última instância, no STF. Aprovou-se uma medida que restringe à Corte Suprema apenas os casos que tenham repercussão geral. Os demais são decididos definitivamente em instâncias inferiores. Os Códigos de Processo Civil e Penal foram alterados, com a introdução de ritos mais céleres, regras mais rígidas para a prescrição e extinção de recursos, em especial no Tribunal do Júri.
 
A Constituição brasileira e as leis mudaram, mas não foi o suficiente. É preciso ir além. E uma forma de aprimorar o sistema é a reforma administrativa do Poder Judiciário.
 
A era da tecnologia chegou com atraso e lentidão à Justiça. A existência ultrapassada de processos em papel, de registros de informações confusos, e dificuldades de comunicação entre órgãos públicos, fazem com que atos processuais simples levem muito tempo. A juntada de um documento, a identificação de um endereço ou da qualificação de uma pessoa seria banal se houvesse um sistema tecnológico eficaz que permitisse a troca rápida e eficiente de informações entre diferentes entidades. No entanto, tais atos demoram meses ou anos devido aos mais distintos entraves burocráticos.
 
Imaginemos um juiz que precisa ter informações sobre o patrimônio de um investigado por lavagem de dinheiro. Fossem os sistemas informatizados, em poucas horas ele teria os registros de imóveis, veículos, contas bancárias, declarações à Receita e operações financeiras recentes do suspeito, fato que garantiria efetividade às investigações. Dada a ausência de instrumentos para isso, tais dados demoram a chegar, afetando a prestação jurisdicional.
 
O fornecimento de informações on-line para a Justiça deveria ser a realidade em cartórios, em registros de veículos, de nascimento, de casamento, de óbito, em bancos de dados sobre mandados de prisão, dentre outros. A integração de sistemas de informação é uma forma eficaz de garantir uma Justiça rápida e consistente.
 
Para além disso, a ampliação da digitalização de processos, do uso de videoconferências, da prática de atos por email, são medidas centrais para um processo mais efetivo.
 
O Judiciário que queremos é factível, e boa parte das políticas para sua implementação estão ligadas a reformas administrativas, de gestão. Independem de mudanças legais ou constitucionais. Não são polêmicas, não afetam interesses corporativos, não despertam reações apaixonadas, nem têm espaço nas manchetes de jornais. São a reforma silenciosa do Judiciário.
 
São menos eloquentes e, talvez por isso, mais eficazes.
 
Pierpaolo Cruz Bottini é advogado e professor da USP. Foi secretário de Reforma do Judiciário do Ministério da Justiça (2005-2007) e diretor de modernização da Justiça do mesmo órgão (2003-2005)
   
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